amigo de Emerson, Ralph Waldo Emerson, filosofia
t-r-a-n-c-e-n-d-e-n-t-a-l estado-unidense, pai de Mohandas
Gandhi, avô de Martin Luther King, bisavô dos hippies...
Bethel Woods, Walden Pound, Maine Woods. And we've got
to get ourselves back to the garden. Quis o destino que
cem anos depois a Nação de Woodstock, do site aos sons,
celebrasse a ascese e os princípios de seu bisavô, Henry David
Thoreau (1817-1862), justo ao lado e no prolongamento
paisagístico de sua New England natal e adotiva. Talvez os ares
dos pinheirais ajude a elevar o espírito e o astral, como se vê
também pela produção de Bob Dylan com Al Kooper, Mike Bloomfield
e The Band de Blonde on Blonde a Basement Tapes.
citado por Gandhi em Correspondência com Lev Tolstoi, que os
dois levaram por algum tempo.
convencido de que a maioria dos meios pelos quais os homens
ganham a vida são degradantes, condenando-os à escravidão
perpétua por se conformarem aos caminhos tradicionais do mundo.
os transcendentalistas não eram filósofos sistemáticos,
empenhados em dispor a forma de vida numa sequência lógica. Pelo
contrário, areditavam viver por inspiração.
definido como ensaista transcendentalista, naturalista, editor,
crítico social
nasceu e manteve base em Concord, Massachusetts, berço de
Emerson e Nathaniel Hawthorne e um dos berçários da grande
narrativa americana, que nascia ali mesmo também com Poe e
Melville na antiga colônia de New England, que explorou de lés a
lés, até os bosques do Maine - Maine Woods. Dela só se ausentou
para estagiar na vizinha Staten Island, Nova York. Por motivos
sólidos: achava que se pode viajar mais num lugar que dando
voltas ao mundo. Formou-se em Harvard, a dois passos de Concord
e Boston, em Cambridge, deu aulas numa escola local e depois
lecionou por conta própria latim, grego e ciências.
Em 1839 fez uma excursão de duas semanas que transformou no
livro de poemas e ensaios A Week on Concord and Merrimac Rivers.
Sua amizade com Emerson iníciou-se em 1843, quando trabalhou
como tutor do seu irmão mais novo em Staten Island, onde morou
com Waldo e a mulher deste, antes de se mudar para a sua casa em
Concord, onde cuidou de tarefas a que o amigo não ligava e
ajudou-o a editar o jornal transcendentalista The Dial.
Em 1845 construiu uma cabana numa propriedade de Emerson nas
margens do lago Walden, onde morou sozinho por dois anos,
observando, escutando, estudando, pensando, sonhando, atento às
variáveis sugestões do lago e fazendo anotações nos diários, em
que se baseou para escrever Walden: or Life in the Woods. Aí
descreve seu estilo de vida experimental enfatizando o despertar
da mente pela meditação, resultante de seu desejo de "viver
deliberadamente" para abolir de si o materialismo e cultivar a
auto-confiança.
Viveu então também experiência crucial para sua notoriedade
através dos tempos pela palestra Resistência ao Governo Civil e
o ensaio Desobediência Civil que ela gerou, e que foram fonte
inspiradora da resistência civil não-violenta do Mahatma e de
Luther King. Thoreau opunha-se à guerra do México, em que os
Estados Unidos conquistaram um terço da ex-colônia espanhola, e
à escravidão. Descreve a experiência também em Walden:
"Uma tarde, próximo ao fim do primeiro verão, quando eu me
dirigia à aldeia para pegar um sapato no sapateiro, fui agarrado
e metido na cadeia simplesmente porque, como já relatei noutro
lugar, eu não pagava imposto e não reconhecia a autoridade do
Estado, que compra e vende homens, mulheres e crianças como
gado, na porta do Senado. Eu havia descido da floresta por
outros motivos. Mas onde quer que um homem vá os homens o
perseguem e o espezinham com suas instituições imundas e, se
podem, forçam-no a pertencer a sua desesperada e bizarra
sociedade. Em verdade, eu devia ter reagido violentamente, eu
devia ir como um louco contra a sociedade, mas preferi que a
sociedade viesse como louca contra mim, já que é ela a parte
desesperada."
a "força de carvalho" era característica que Emerson mais
admirava em seu trabalho
WALDEN: OR LIFE IN THE WOODS
(1854)
ECONOMIA
ONDE VIVI E PORQUE VIVI
SOLIDÃO
VISITANTES
A PLANTAÇÃO DE FEIJÃO
A ALDEIA
OS LAGOS
BAKER FARM
LEIS UNIVERSAIS
VIZINHOS BRUTAIS
INAUGURAÇÃO DO LAR
PRIMEIROS HABITANTES E VIZINHOS DE INVERNO
ANIMAIS DE INVERNO
O LAGO NO INVERNO
PRIMAVERA
trechos
ECONOMIA
Porque começariam eles [os homens] a cavar suas próprias covas
logo depois de nascidos? (...)
Mas os homens trabalham por equívoco. (...)
ele não considera aquilo que é realmente respeitável, mas o que
é respeitado. (...)
Nós não adoramos as Graças, as Parcas, mas a Moda. Ela fia e
tece e corta com inteira autoridade. O macaco-mor em Paris põe
uma capa de viajante e todos os macacos da América fazem o
mesmo. (...)
[nas cinquenta páginas iniciais fala de vestuário, moradia e
mobília e sobre o que neles é necessário ou mera ostentação]
Ao pobre do estudante é ensinado somente economia política,
enquanto economia na vida prática, que é sinônimo de filosofia,
não é nem mesmo sinceramente professada em nossos colégios.
(...)
O modo de fundar um colégio é, comumente, abrir uma subscrição
de dólares é cêntimos. A consequência disso é que, enquanto ele
está lendo Adam Smith, Ricardo e Say, está irremediavelmente
forçando seu pai a endividar-se cada vez mais. (...)
ONDE VIVI E PORQUE VIVI
nem sempre o progresso é positivo. (...)
Mas eu sou mais sábio. Aprendi que o viajante mais rápido é
aquele que viaja a pé. (...)
se a estrada de ferro circulasse o mundo penso que me
conservaria sempre na sua [do trem] frente. (...)
`O que!´, exclamam um milhão de irlandeses precipitando-se de
todas as casas da terra, "não é essa estrada de ferro que
construímos uma coisa útil?" Sim, respondo, comparativamente
útil, isto é, vocês poderiam ter feito coisa pior, mas quem me
dera, já que são meus irmãos, que vocês pudessem ter gasto seu
tempo melhor do que cavando esta terra poeirenta. (...)
As nações estão tomadas por uma ambição insana de querer
perpetuar sua memória pela quantidade de pedra esculpida que
deixam. Que tal se desejo semelhante os fizesse polir e abrandar
seus hábitos? Uma pequena parcela de bom senso seria mais
memorável que um monumento tão alto quanto a lua. (...)
já que tanto amava a filosofia da India. (...)
E, por Deus, que mais pode um homem razoável desejar, em tempos
de paz, em tardes comuns, que um número suficiente de espigas de
milho cozidas com um pouco de sal? (...)
Dizem os vedas: "Toda inteligência desperta com a manhã."
Ainda não encontrei um só homem que estivesse perfeitamente
acordado. (...)
Toda manhã era um convite jovial para viver com a mesma
simplicidade, ou devo dizer, inocência, da natureza. (...)
Retirei-me aos bosques porque desejava viver deliberadamente,
ver-me à frente, apenas, dos fatos essenciais da vida...)
[je veux regarder
Dieu en face]
Li num livro hindu (...)
Eu compreendi então o que os orientais querem dizer por
contemplação e abandono ao trabalho.
SOLIDÃO
Não pode haver verdadeira melancolia para aquele que vive no
meio da natureza e conserva seus sentidos serenos. (...)
VISITANTES
Não sou naturalmente um eremita e posso possivelmente estar
ao lado do mais ousado frequentador de salas de bar
[saloons] se meu interesse assim o exigir. (...)
nem mesmo no outono, quando eu passava quinze dias nas
florestas do Maine. (...)
OS LAGOS
há qualquer coisa essencialmente imundo numa dieta
carnívora. [imundo também no sentido da sujeira que produz a
confecção dos alimentos] (...)
Creio que todo homem que foi cuidadoso em preservar suas
altas ou poéticas faculdades nas melhores condições é
particularmente inclinado a abster-se de carne e de excesso
de alimento de qualquer espécie. (...)
Haia em mim, e ainda há, um instinto que me conduzia a uma
mais alta, como é chamada, vida espiritual, como procede a
maioria dos homens, e um outro que me conduzia a um estado
primitivo e selvagem. Eu respeitaa a ambos. Não amo menos a
selvageria que a bondade. (...)
Agora que os troncos repousavam no fundo, a velha canoa e as
árvores ribeirinhas desapareceram, os habitantes da aldeia,
que jamais poderiam dizer onde eles estão, em lugar de irem
ao lago para banhar-se ou mitigar a sede, estão planejando
baldear sua água - que devia ser sagrada como a do Ganges -
para lavar seus pratos com ela! Fazer o Walden escorrer por
uma torneira, ou jorrar no orifício de uma pipa. Esse
diabólico cavalo de ferro, cujo dilacerante relincho é
ouvido em toda a cidade, desvorou todas as árvores da margem
do Walden (...)
Que importa
que Woodstock seja hoje apenas mais uma atração turística -
capital amerikana do folk-lore bandoleirístico anos 1960, pós e
sempre beat, como Indianápolis é a meca do automoblilismo,
Milwalkee da pilsen e San Francisco do LGBTQ..rsu...
u sic transit..........................................
já que tanto amava a filosofia da
India.
Dizem os vedas: "Toda
inteligência desperta com a manhã."
Li num livro hindu
Eu compreendi então o que os orientais querem dizer por
contemplação e abandono ao trabalho.
Dizem os orientais...
Thoreau também focado no Oriente inspira Mahatma Gandhi
também por aí.
.TUDO
QUESTÃO DE VALORES
QUESTÃO MORAL E PECUNIÁRIA
QUESTÃO MORAL E DE MORAL PECUNIÁRIA
ISHMAEL
Como o Mundo Veio a Ser o Que É DANIEL QUINN
1992 fala
da história do homem como a de Pegadores e
Largadores, uma encenação
thoreau sic transit
Robert
Anton Wilson em The
Illuminati Papers
|
... a
abolição da pobreza, a economia da abundância para todos, o fim da
competição territorial por recursos limitados conducente ao ciclo
da guerra, atingir a longevidade e eventualmente a imortalidade.
Todas estas competições do segundo circuito (como Leary lhes
chamaria) resultam das pulsões mamíferas básicas: paixão, status,
território (propriedade).
Como
resolver então os problemas que afligem este planeta? Não através
da política, esse ritual mamífero irrelevante. Resolveremos os
nossos problemas através de tecnologia melhor, mais barata e mais
eficiente; e especialmente através da migração para o espaço, da
tecnologia da consciência e aumento da inteligência, e do
prolongamento da vida.
... Após estas
experiências começaremos a passar gradualmente de robôs totais
para autoprogramadores.
Temos o azar de pertencer a uma espécie mamífera dotada de
tecnologia suficiente para tornar estas futricas crescentemente
oniletais. Mas isto sucede provavelmente em todos os planetas
sustentadores de vida durante a evolução do estado mamífero para a
verdadeira inteligência. Encontramo-nos apenas a meio do ciclo
evolucionário da nossa estrela e nos últimos milhares de anos já
começaram a surgir formas mais avançadas em mutantes ocasionais.
[Ezra Pound torna
claro que] não acredita, como a maioria dos Utópicos, que a
reforma do mundo é meramente uma questão de conseguir que suas
ideias político-econômicas ganhem aceitação generalizada. A
consciência superior, a sensibilidade sutil, devem surgir
primeiro, antes de poder manifestar-se a "ordem
cívica".
Aqueles que pensam que
a subordinação de Pound à economia fascista * significava uma
devoção à política fascista confundem completamente a questão.
* Tratava-se principalmente de uma submissão à
ideia de dinheiro não gerador de juros cunhado pelo Estado como
distinto da prática corrente na qual 72% de todo o "dinheiro"
existe apenas em livros de contabilidade e serve como dívida
geradora de juros para banqueiros privados.
... Todos os fatos da
Ciência foram outrora Danados, todas as invenções foram
consideradas impossíveis. Todas as descobertas foram choques
nervosos para alguma ortodoxia. Todas as inovações artísticas
foram denunciadas como fraudulentas e levianas. Toda a malha da
cultura e do "progresso", tudo quanto na terra é feito pelo homem
e não nos é dado pela natureza, constitui a manifestação concreta
de algum homem recusando a submeter-se à Autoridade. Se não fossem
os rebeldes, os recalcitrantes e os intransigentes, não teríamos
mais, saberíamos mais e seríamos mais do que os primeiros
hominídeos. Como disse em verdade Oscar Wilde, "A desobediência
foi a virtude original do homem".
Para onde vais Améria dentro da noite em teu carro brilhante?
- Jack Kerouac, On the road
A Guerra Civil, a expansão para Oeste, as levas de imigrantes da
Europa continental, a passagem de uma fisionomia agraria para uma
base urbana e industrial geram uma literatura universal que fala
do espírito de liberdade do "sonho americano" e da crença nesse
sonho - Walt Whitman (The leaves of grass,1855, um ano depois da
publicação de Walden), Mark Twain (Tom Sawyer, Hucleberry Finn).
O sonho cedo se dissipa e logo a crítica social ocupa o lugar da
glorificação da sociedade americana, com a denúncia da especulação
e da corrupção que movem o progresso acelerado, a tirania dos
hábitos e das convenções que desmentiam o mito do lar dos bravos
homens que erguiam uma nação democrática em que os indivíduos
viveriam livres e como iguais, movida apenas pelo lucro e moldada
por uma classe média conformista e fascinada pela riqueza.
A grande poesia norte-americana da primeira metade do século XX
não é mais tão americana assim. A ficção desse período é já a da
"geração perdida" ou a ela aparentada. O inverno do nosso
descontentamento de John Steinbeck é mais um grande documentário
intimista da desilusão.
A beat generation contesta o próprio american way of life em que
se baseara o sonho.
"Acabaram reduzindo uma população inteira (da Amerika) a uma
mentalidade infantil", resumia Allen Ginsberg em tom de "profeta
cansado de tantas lutas" (Waly Salomão) em 1992.
Comentando a obra de Jack Kerouac em 1994 William Burroughs disse
que ela "traz um espírito de liberdade americana que já não existe
mais".
Dizia Ginsberg dois anos antes: "Os jovens de hoje não sabem o que
significa a velha liberdade, e isso é triste."
ANIMAL
Há um elo
entre as guerras solitárias e isoladas de Thoreau em Concord vai
para dois séculos no coração da Amerika ainda em formação e as
perigosas e divertidas bravatas de juventude dos hippies urbanos
do Yiuppie, Abbie Hoffman, Jerry Rubin, Paul Krassner et caterva
e entre Thoreau e a linhagem de Hesse, Aldous Huxley, D.H.
Lawrence, Henry Miller e Bukowski beat/hipster sem o ser/antes
de o ser.
E, por Deus, que mais pode um homem
razoável desejar, em tempos de paz, em tardes comuns, que um
número suficiente de espigas de milho cozidas com um pouco de
sal? (...)
Limparia a
minha bunda com areia.
anarcohippie
anarcohippie
|
|
thoreau sic transit
hesse huxley bukowski |
Nada é sagrado, a não ser a
integridade de nossa própria mente. - Ralph Waldo
Emerson (1803-1882) - Ensaios Primeira Série.
Os jovens dos anos 1960 parecem
retomar literalmente a lição do fundador do transcendentalismo
junto com Henry David Thoreau, tido como o bisavö dos hippies.
Abbie Hoffman - que a par do ativismo político como um dos líderes
do Yippie foi um publicista hiperativo - deu-se ao trabalho de
escrever seu auto de fé no manifesto The Woodstock Nation às
vésperas do julgamento do processo contra os 7 de Chicago em 1969:
(...) quero ser julgado não por
apoiar a Frente de Libertação Nacional (do Vietnã) - como
aconteceu de fato - mas por ter os cabelos compridos. Não
por apoiar o Movimento de Libertação negro mas por fumar
entorpecentes. Não por ser contra o sistema capitalista mas
porque penso que a propriedade é uma pulhice. Não por
acreditar no Poder Estudantil mas porque se devia fazer
explodir as escolas. Não por ser contra o liberalismo
corporativo mas porque penso que as pessoas deveriam fazer
tudo o que lhes dá na veneta e não porque tento organizar a
classe operária mas porque acho que os guris deviam matar os
pais. No fundo deveria ser julgado por só fazer o que estou
a fim e não ser sério. Não me encolerizo contra a guerra do
Vietnã, o racismo ou o imperialismo. Evidentemente que sou
contra tudo o que cheire a sujeira mas o que me chateia
VERDADEIRAMENTE é que companheiros meus estejam na prisão
por causa de droga e que a polícia me detenha na rua por ter
os cabelos compridos. É um fato que conspirei, que sou
culpado. Culpado de ter criado uma terra livre onde se pode
fazer o que se quiser. Culpado de ter querido estender a
NAÇÃO DE WOODSTOCK à terra inteira. Culpado de ter tentado
estourar com este sacana governo senil dos Estados Unidos.
Yippie?!
trecho
de .................................................de James Anhanguera
Prefiro então delirar com a ideia neo-grouchomarxista do YIPPIE!, segundo a qual
revolução é por natureza o êxtase, a festa, manifestação do
grito primal, instintivo, de liberdade, a verdadeira vida, em
que o partido só pode ser um party, órgão difusor da
baderna, como Abbie Hoffman
e Jerry Rubin pretenderam
fazer do seu Party Internacional da Juventude. Uma piada, mas
dadas as alternativas possíveis o melhor mesmo é brincar,
porque a questão não é mudar a sociedade mas criar uma
paralela.
- Em Marte,
talvez...
- Foi o ponto a que
chegou Paul Kantner ao criar o Jefferson Starship, depois de
ter apoiado toda a sorte de revolucionários, mesmo da chamada
Nova Esquerda
neo-marxistó-marcusiana: brincar com a ideia de que uma
sociedade alternativa só poderia ser criada em outro planeta
ou galáxia. Vira e mexe e voltamos ao mesmo, impensável para
mim até a tão pouco tempo: Proudhon e o conceito de ‘revolução
integral’, segundo o qual, em face de um mundo em dissolução,
é necessário partir para uma remodelação total das idéias e
dos corações. Como operá-la? Como acabar com a cultura da
neurose, contra natura, e impor o princípio do prazer sobre o
da realidade, drop out, fazer do corpo o mais
possível instrumento de prazer, sair para outro mundo desta
história de martírios, regredir ou evoluir para a
desintegração de instituições como a família monogâmica
patriarcal para escapar ao desastre, como prognosticou Marcuse
sem no entanto dar-nos a receita.
Aqui, ó – vou ao quarto e pego um dos meus livros de consulta.
- Do famoso
manifesto Woodstock Nation, de Abbie Hoffman: A
revolução política leva a que as pessoas desejem outras
revoluções em vez de fazer a sua. A revolução cultural leva as
pessoas a mudarem o seu modo de vida e a agir de maneira
revolucionária em vez de criticar a maneira como os outros se
comportam. A perspectiva cultural gera "foras-da-lei", a
política produz organizadores.
- Tudo muito
bonito, mas que da mesma forma não leva a nada...
- Um sonho. Lá dizia o
pacifista Lanza Del Vasto
logo após o 68, que se arribou a um ponto de tal modo
decepcionante que alguns chegam a desejar a revolução, a
desordem perpétua, em que ao menos se viveria a salvo de
uma ordem cinzenta, monótona. Idéias estapafúrdias,
talvez, de que em muitos rincões não houve e não há a
mínima ressonância, a não ser de um certo modo antigo
nas pichações anarquistas, também porque de repente a
esta altura já não fazem nenhum sentido, além do plano
literário. Fazer primeiro a revolução do indivíduo e da
cultura para dinamitar a estrutura política, a ver se
poderíamos de algum modo escapar da democracia de
fachada, da mera descentralização político-econômica, e
como aceitar democracia sem uma participação direta de
todos nas decisões, sem ficar à mercê de poderosos lobbies
de manipulação da opinião pública mais as suas maiorias
silenciosas? Nossa geração perdeu o trem do tempo do
bota-abaixo e parece não haver como retomar qualquer
coisa do gênero, tipo fazer de uma passeata um
verdadeiro espetáculo de cor e alegria, brincar como
Hoffman de tentar fazer o Pentágono levitar. Ou como
dizia outro que tal, Ron Laing, no belo A Política
da Experiência e a Ave do Paraíso: se somos
incapazes de saber o que se passa fora do campo da
nossa experiência, como posso embarcar em políticas
voluntariosas para mudar um mundo que não sei como é?
Que revolução é a que não muda nada em termos de
mentalidade e de relacionamento das pessoas, baseando-se
na mesma atitude hipócrita de manutenção de valores
caducos que ninguém está interessado em rediscutir? O
princípio básico enunciado por tudo quanto é força
política, com a exceção da direita e de grupelhos de
extrema-esquerda, é o da consolidação da democracia e da
justiça social, mas há muito mais a fazer também, embora
se diga não ser prioridade, muito pelo contrário, porque
o uso diluviano de drogas, por exemplo, combate-se com
métodos policialescos e
acabou-se. A Gloriosa degenera até acabar em Napoleão, na política como na
cátedra, em relação à qual também nem se cogita uma
remodelação, em termos de estrutura da Academia e de
currículos. Os estudantes expulsaram os dedos-duros
& durões, que serão provavelmente substituídos por
dedos-duros & durões de outras causas, mas sempre
dedos-duros & durões e possivelmente mais burros.
Ninguém põe em causa o ensino das apostilas sebentosas
de caretice, estreitristeza de visão. Direito
da Família?! Oitenta páginas de decoreba e acabou-se.
Quem vai pôr em causa o Direito de Família e o Código
Penal?
thoreau sic transit
huxley |
Armas
nucleares, Guerra Fria e superpopulação são novos ou antigos
problemas que anteviu transformando a vida em um pesadelo e que
abordou em Regresso ao Admirável Mundo Novo,
coletânea de ensaios publicada em 1958.
Huxley protesta contra o peso crescente do poder corporativo no
aparelho de Estado e da publicidade e da propaganda política
sobre a população através dos meios de comunicação de massa e o
uso de tranquilizantes.
Uns exercem a função da hipnopédia (método educacional
eletrônico), outros o do soma de Admirável Mundo Novo.
Num universo dominado por ‘jingles’ publicitários os homens
perdem toda a noção de liberdade e individualidade e tornam-se
presas de prazeres voláteis.
Dêem-me hambúrgueres e televisão e não me encham a paciência
com as responsabilidades da liberdade é o lema
comum, segundo Huxley, que insiste em propostas para a
melhoria das condições de vida através de reformas políticas
tendentes a uma descentralização do poder rumo a um auto-governo
responsável através de grupos de representação política direta
que teriam por princípios básicos a não-violência e a
‘resistência à guerra’.
Em tempos de macartismo Washington não lhe concedeu cidadania
americana por ser um notório adversário do Estado
corporativista, dos arsenais nucleares e do consumismo.
A militância em prol dos psicodélicos lhe terá custado o
Nobel. Mas em 1959 a Academia Americana de Artes e Literatura
atribuiu-lhe o Prêmio do Mérito do Romance.
Em fevereiro de 1959 Huxley realizou na Universidade da
Califórnia em Santa Bárbara uma série de conferências
subordinadas ao tema A Situação Humana, em que abordava os
problemas ecológicos de uma perspectiva inovadora, em que o
homem não permanece do lado de fora da natureza, observando-a ou
danificando-a, mas integrado a ela, em conformidade com os
princípios do hinduísmo e do budismo e com a ‘nova visão’
adquirida através das experiências
extra-sensoriais.
Morre Gandhi durante a redação do filme-livro O Macaco e a
Essência e Huxley insere um depoimento sobre o antiherói da
não-violência: ‘Matamo-lo porque, depois de por breve (e fatal)
período de tempo ter jogado o jogo político, recusara-se a
continuar sonhando o nosso sonho de ordem nacional, de beleza
social e econômica; porque tentara chamar-nos aos fatos
concretos e cósmicos dos povos autênticos e à luz interior.’
Tudo e todas as questões assentam numa premissa básica, para
Aldous Huxley: educação.
Em um dos ensaios de Ends
and Means, de 1937, afirma que a escola deve
desenvolver o senso crítico dos alunos e não ser um curso
preparatório de escravidão intelectual em que a pedagogia é mera
ferramenta de educação de robôs para a nova desordem mundial.
Mas acima de tudo o mundo - a dois anos de novo conflito mundial
mas já com a Europa conflagrada - carece de uma mudança de
mentalidade e no plano da ética: os fins
nunca justificam os meios, clama no deserto da Europa dos
Ditadores.
Vinte anos depois, em Regresso
ao Admirável Mundo Novo, alude a uma educação que
ensinasse as pessoas to see beyond the easy slogans, efficient
ends and anesthetic influences of propaganda a ver além dos
slogans fáceis, objetivos eficientes e influências anestésicas
da propaganda.
Talvez as forças que agora
ameaçam a liberdade sejam fortes demais para que se lhes possa
resistir por muito tempo - pondera, mas sem que isso o leve à
idéia de rendição súbita e incondicional:
É ainda nosso
dever fazer qualquer coisa para resistir a elas.
A
educação, ensina, é apenas uma peça da engrenagem, porque lá
adiante os vendedores de política apelam para as fraquezas
dos eleitores, não para a sua força potencial.
Educação e desenvolvimento
humano, individual e coletivo - e num sentido lato, que é o que
dá sentido a educação e desenvolvimento. Porque
somente com a noção da sua Essência o homem pode deixar de ser
muitos macacos - versos de P.B.Shelley que põe na
boca de Alfred Poole, professor de Ciências Naturais em O
Macaco e a Essência.
Eis o eixo das
preocupações e propostas do estudioso e pensador, que ajudou a
lançar as bases de uma estratégia de melhoria da condição humana
- from the meaninglessness in life to the meaning of existence -
que ainda não foi devidamente compreendida, e menos ainda
aplicada.
A
América não é mais a mesma do imediato pós-guerra e se, apesar
da estatura física e intelectual, a máquina conseguisse tirar
uma sua foto de corpo inteiro o que se nos revelaria, por
incrível que pareça, seria um jovem escritor de origem inglesa
mas decididamente americanizado, com uma visão também americana
da vida e do mundo. Ou por que não, para resumir e indo à
essência dos fatos, um jovem escritor americano - sendo isto
precisamente o que mais se lhe recrimina nos meios intelectuais
ingleses: ter-se deixado ficar na América e deixado que ela lhe
desse a volta à cabeça. O gentleman aristocrático inglês de
quatro costados não poderia ser um rock’n’roller mas é já
decididamente beat pela forma como escreve e fala para uma
América em convulsão, cuja população mais jovem já não quer mais
saber apenas e só de subir na vida, realizar-se financeiramente
e viver o grande sonho dos solitários subúrbios arborizados da
prosperidade material, o que é patente também no livro de poemas
Howl, de Allen Ginsberg, que pela turbulência e contundência da
linguagem foi alvo de um clamoroso processo judicial.
Como relator de um simpósio sobre drogas psicodélicas realizado
em Atlantic City no congresso da Associação Americana de
Psiquiatria de 1955, Huxley falou quase da mesma forma dos
jovens de uma nação bem alimentada mas metafisicamente famintos,
em busca de visões beatíficas no único caminho que conhecem, o
das drogas, e como James Dean, um dos ícones da era, mas
obviamente muito mais articulado, fez questão de lembrar aos
adultos que o mundo verdadeiro é muito diferente do universo
deformado que criaram para si mesmos através de preconceitos
condicionados pela sua cultura. Como que possuído por um
permanente espírito de contradição, e tal como nos ruidosos anos
20, o míope Huxley teima em enxergar além das aparências de
bem-estar de progresso e paz do pós-guerra de guerras na
Indochina e macartismo e alertar para cada aspecto negativo da
falta de planejamento do desenvolvimento industrial. É um dos
arautos da crescente onda de rebeldia contra os mesmos valores
caducos, ainda que de feições alteradas, que combateu na
juventude.
Huxley
intitula o seu novo livro de ensaios de Ends and
Means (Fins e Meios), cuja
mensagem básica é a de que o desprendimento é a
essência da sabedoria.
Com o subtítulo de Um Inquérito Sobre a Natureza
das Ideias e Sobre os Métodos Aplicados Para a Sua Realização, Ends
and Means é uma bóia de sinalização de inversão
de rota na obra de Huxley. Nele o escritor abandona de vez o
racionalismo que o caracterizou desde as blasfêmias contra os
‘bons’ costumes burgueses e vitorianos e arma as velas para o
sopro da desejada iluminação mística. Mas o abandono da lógica
racionalista dá-se com toda a pompa do formalismo inglês, e ao
enunciar novos princípios fecha as contas com os do passado.
Inspira-se no prefácio de George Bernard Shaw a Back
to Methusaleh, de 1921, em que o dramaturgo
irlandês renega a própria trajetória no que chamou de ‘meio
século infiel’ de desacato aos valores do seu tempo de juventude
– afinal a mesma longa era vitoriana -, para dizer que, de todo
o modo, teve fortes ‘motivos para não querer que o mundo tivesse
um significado’:
... a filosofia da falta de significado era
essencialmente um instrumento de libertação de um certo
sistema de moralidade. Fazíamos objeções à moralidade porque
ela ia interferir na nossa liberdade sexual. Os apoiantes
deste sistema diziam que ele incorporava o significado – o
significado Cristão, insistiam – do mundo. Havia um método
admiravelmente simples de contestar essa gente e nos
justificarmos na nossa revolta erótica: negaríamos que o mundo
tivesse algum significado.
Huxley defende uma revolução no ensino para que as escolas
invistam no potencial humano, deixando de ser fábricas de
produção em série de especialistas despersonalizados e passando
a criar cidadãos educados
para a liberdade, inteligência e cooperação responsável e
voluntária e não para a aceitação passiva da tradição, tendo
apenas como escolha as vias do poder ou da subordinação. O
pensador não abdica, implícita ou explicitamente, do antigo
conceito proto-iluminista de poder de uma ‘elite esclarecida’
mas tão pouco renuncia ao do primado da individualidade sobre a
uniformidade do rebanho de autômatos. A aposta no potencial
humano, baseada no poder criativo e de imaginação de cada
indivíduo, é e continuará sendo um ponto cardeal da filosofia de
Huxley, baseada na necessidade de uma mudança profunda na
formação dos cidadãos para a mudança de rumo de toda a
sociedade. Uma utopia desmedida que ainda o irá deixar a bradar
como louco no deserto. Ou no manicômio
thoreau
sic transit bukowski |
Charles
Bukowski Ham on rye - Misto quente
ANIMAL
trechos
Então
era isso o que eles queriam: mentiras. Mentiras maravilhosas.
Era disso que precisavam. As pessoas eram idiotas.
Não somente os adultos, mas os garotos e até mesmo os animais
se tornaram cruéis. Era como se os bichos assumissem o estado
de espírito das pessoas. (...)
Por que tudo se reduz a escolher entre algo ruim e algo ainda
pior? (...)
.......... -
Washington é um lixo, Becker.
.......... -
E mulheres? Casamento? Crianças?
..........
- Lixo.
..........
- É. Mas o que é que você quer, afinal?
..........
- Me esconder. (...)
A luz do luar entrou trazendo consigo os sons da cidade:
vitrolas, automóveis, palavrões, latidos, rádios... Estávamos
todos juntos nisso. Todos juntos num grande vaso de merda. Não
havia escapatória. Todos desceríamos juntos com a descarga.
(...)
A Terra inteira não era nada além de bocas e us engolindo e
cagando e fodendo.
havia algo de estranho em mim. Era como se meu destino fosse
ser um assassino, um ladrão de banco, um santo, um estuprador,
um monge, um ermitão. Precisava de um lugar isolado para me
esconder. Os cortiços eram lugares nojentos. A vida das
pessoas sãs, dos homens comuns, era uma estupidez pior que a
morte. Parecia não haver alternativa possível. A educação
também poderia ser uma armadilha. A pouca educação que eu
tinha me permitido havia me tornado ainda mais desconfiado. O
que eram médicos, advogados e cientistas? Apenas homens que
haviam permitido que sua liberdade de pensamento e capacidade
de agir como indivíduos lhes fosse retirada. (...)
O universo da faculdade era brando, um faz de conta. Jamais
lhe diziam o que esperar do mundo real lá fora. Apenas o
entupiam com teorias e nunca o alertavam sobre a infinita
dureza dos calçamentos. Uma educação universitária poderia
destruir um homem para sempre. Os livros podiam fazer de você
um frouxo. Quando você os deixa de lado e vai ver como
realmente são as coisas do lado de fora, então é preciso ter o
conhecimento que não está naquelas páginas. (...)
O que eu queria era uma caverna no Colorado com um estoque de
comida e bebida para três anos. Limparia a minha bunda com
areia. Qualquer coisa, qualquer coisa que me salvasse do
afogamento desta existência trivial, covarde e estúpida. (...)
O pensamento de ser alguém na vida não apenas me apavorava mas
também me deixava enojado. Pensar em ser um advogado ou um
professor ou um engenheiro, qualquer coisa desse tipo,
parecia-me impossível, casar, ter filhos, ficar preso a uma
estrutura familiar. Ir e retornar de um local de trabalho
todos os dias. Era impossível.
# tradução de Pedro Gonzaga, L&PM,
Porto Alegre.
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