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2015-2020 -
PREFACIO 2020
MÃOS
LIMPAS, LAVA JATO
a bossa e a boçalidade
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Queste cose
succedono solo in Sud America, nelle repubbliche
delle banane – Giuliano Ferrara, 2020
Até nisso Itália e Brasil têm algo em comum, como se
cumprissem trajetórias paralelas, salvaguardadas as
distâncias – culturais e de desenvolvimento: expurgos
por corrupção provocam graves crises institucionais.
Acusa-se a Operação Mãos Limpas de tirar o poder de
Bettino Craxi para pô-lo no colo de Silvio Berlusconi
e - piorɁ - do Movimento 5 Stelle. Craxi, o líder
socialista dos anos 1980, é dado pelos críticos da
ação das Mani Pulite como o governante mais competente
em 48 governos de meio século da chamada I República
italiana, sobre que a operação do ministério público
de Milão pôs uma lápide.
A purga provocada pelos promotores seria para os
críticos o instrumento principal de uma conspiração
para minar de vez a ordem político-institucional do
pais, que Craxi só governou por quatro anos e esteve
quase sempre sob a batuta do partido da Democracia
Cristã, com ramificações do Vaticão ao maçonismo,
serviços secretos, CIA e cosa nostra.
Do mesmo modo a Operação Lava Jato é acusada de ter
tirado o poder do Partido dos Trabalhadores após 13
anos de governação petista para dá-lo de bandeja a
Jair Bolsonaro.
É o que dá acreditar cegamente na Justiça quando esta
– em nome de quais interesses? - põe
demagogicamente a luta contra a corrupção acima de
tudo, mesmo do regime democrático de direito.
A Lava Jato teria sido também um trampolim para o juiz
que julgou os processos por ela gerados em três anos,
Sérgio Moro, catapultado à mais alta esfera política.
Antonio Di Pietro, o catalisador da força-tarefa das
Mãos Limpas, também cometeu deslizes éticos e/ou
morais, de que se desculpou e basta. Finda a operação
o magistrado também ensaiou uma carreira política num
dos novos partidos de centro-direita no início da
chamada II República, dominada por Berlusconi, mas
cedo caiu fora da política.
A Mani Pulite não condenou ninguém sem provas ou sem
fortes indícios dos delitos, como as confissões dos
socialistas Craxi, Claudio Martelli e Gianni De
Michelis de participação no esquema de propinas entre
empresários a partidos vigente no tempo em que a
Itália estava sob o domínio da CIA e da DC e era o
porta-aviões mais geoestratégico do Mediterrâneo.
Sérgio Moro condenou duas vezes Lula, o ex-presidente
e líder do PT, que não confessou nada, sem provas,
argumentam os críticos da Lava Jato. Sua cruzada
anticorrupção ficou indelevelmente manchada quando se
sabe que atuou para tirar Lula da vida política
brasileira, agiu em prol da eleição de Jair Bolsonaro
e trocou a magistratura pelo posto de ministro da
Justiça do novo presidente com um olho numa vaga no
Supremo e outro na sua sucessão.
A trajetória do ex-juiz tornou mais claro o interesse
político numa ação que segundo as primeiras
interpretações estaria a demonstrar que a nova geração
de magistrados brasileiros estava determinada a banir
a impunidade do Brasil.
Quando eclodiu o escândalo do mensalão, em 2005,
Sérgio Moro estudou a fundo o processo das Mani Pulite
e com seus ensinamentos quanto a filigranas jurídicas
e como tentar superar embargos da justiça montou um
plano para eliminar Lula e o PT que escancarou as
portas do poder para a extrema-direita. O escândalo do
petrolão foi um prato cheio para a oposição
direitista, que após trinta anos voltou a assanhar-se
com o perigo comunista, seja isso o que for.
Vira e mexe, uns e outros dá no mesmo. Década após
década, do pedágio de PC Farias em Brasília no governo
Collor a vultosas somas de dinheiro achados em cuecas
em alfândegas de aeroporto e 50 e tantos milhões de
reais encontrados num bunker de um deputado e
ex-ministro em Salvador, os brasileiros encheram o
saco de, vai direita e vem esquerda, e vice-versa, ver
roubalheira a rodos e o país a afundar cada vez mais.
Do mesmo modo na Itália o bordel alegremente corrupto
e mafioso em que Berlusconi se criou irritou de mais
os italianos, mesmo durante os governos Craxi, quando
o país vivia o segundo boom econômico depois de quase
uma década de chumbo. Boom provocado em grande parte
pela criatividade da grande, pequena e micro indústria
e do artesanato local, não a governos paralíticos como
os de Craxi, que nesse aspecto se limitava a surfar na
onda e, por tabela, tirar os benefícios possíveis.
Trinta anos de Brasiliana e Pau Brasil no país do
Collorgate
deu na irresistível ascensão da extrema-direita, em
regresso insuspeitável da boçalidade escancarada
(escrachada).
Seis anos depois a Operação Lava Jato, que mandou
prender um ex-presidente e vários políticos e
empresários de ponta do setor da construção civil, não
mudou uma vírgula no ambiente de vampiranhismo,
vale-tudo, e não indica nenhuma mudança de cenário,
mudam as moscas, enquanto inexiste uma sociedade civil
propriamente dita com alguma ideia que chame de seu um
país dividido em casa-grande e senzala.
O pote transbordou com a burocracia a travar o
desenvolvimento, sendo sobretudo a teia do
propinoduto, e gerou alta dose de intolerância aos
políticos e fenômenos como Berlusconi, cria de Craxi,
e Beppe Grillo, talvez de um gênero novo de político,
comunque vecchia maniera, e no Brasil deu numa
potencial ditadura militar fake.
Italia é Italia e ela lá se ajeita agora na UE. O
Brasil para já desandou, desorientado, incapaz de
acordar para uma ideia do que fazer, com cada vez
menos bossa e mais boçalidade.
Se cobrir
vira circo, se cercar é hospício – Maurício Tapajós-Aldir
Blanc