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       MÚSICA DO BRASIL DE CABO A RABO

   

 

    O LIVRO DA SELVA

 

 

   3.   OS CANTORES DO RÁDIO

 

       ciberzine   & narrativas de james anhanguera

 

 

        a

    ESTreLa

SoBE

 

 

 

 

  Sessão Nostalgia de Vovô

   

   ou um inquérito sobre algumas coisas que

   desapareceram no Rio de Janeiro desde a   

          ÉPOCA DE OURO e os ANOS DOURADOS

 

 a partir de A Estrela Sobe 

         de Marques Rebello 

 Tristes Tropiques 

 de Claude Lévi-Strauss

 e Brasil, País do Futuro

 de Stefan Zweig

 

 

                        Brasil 1930-1960

           Rio de Janeiro capital federal

 

 

 

  OS CANTORES DO RrrÁDIO

 

 

 

Eram 8h30m da manhã do 24 de agosto de 1954 quando Pedro Gomes me telefonou: o rádio estava tocando uma rumba quando uma voz interrompeu a música dizendo que o Getúlio acaba de se suicidar, depois a rumba continuou.

                                                                                                Fernando Sabino – em crônica de 1974 no Jornal do Brasil

 

 

   O tiro que mudou a história, como reza um chavão. Que mal deve ter ressoado atrás dos reposteiros do setor residencial da sede do governo, o Palácio do Catete, mas que foi muito mais que um grito de misericórdia. Saio da vida para entrar na história...  Afinal não é todos os dias que um presidente em exercício se suicida na própria sede do governo. Uns quantos são mortos, outros se envenenam conforme os planos quando os russos já estão a dois passos.

   Quanto aquele tiro mudou a história é o que importa, mas  ninguém sabe.

   Dizer que mudou muito é pouco.

   Ele pôs termo a um quarto de século de domínio getulista, período correspondente à ascensão e queda do nazismo após uma guerra mundial em que morreram quarenta milhões de pessoas e o advento do pesadelo nuclear. Nenhum outro estadista se suicidou em pleno exercício do poder e após tanto tempo de intimidade com ele. Suicidou-se talvez pela iminência de perdê-lo para sempre e com seu gesto para todos os efeitos insano quis talvez perpetuá-lo. Já o haviam obrigado a apear-se dele uma vez. Não o fariam de novo.

   A rumba antes e depois do tiro não é mero detalhe. Era a rádio em causa na crônica de Sabino a Rádio Nacional e entre a rumba e o anúncio terá Pedro Gomes ouvido a vinheta de abertura e encerramento do

  alô alô Repórter Esso alô! ... ?

   Não é também detalhe de somenos. A Rádio Nacional chegava a todos os pontos onde houvesse sinais de civilização e com ela o Jornal Nacional (Rede Globo de Televisão) da época.

   Uma rumba antes e depois.

   E logo uma rumba...

   Em muitos países ter-se-ia ouvido talvez uma rumba antes mas com certeza um interlúdio camerístico ou sinfônico ou uma marcha militar de John de Souza depois.

   A rumba que estava no ar antes foi retomada de propósito?

   Quem pôs a danada da rumba no ar?

   Uma RUMBA... Apesar de seus contornos trágicos – ou talvez por eles mesmos - o Brasil daquela época era também muy salsero.

 

   Da ditadura getulista – de fato de 1930 a 1945, ainda que formalmente só a partir de 37 – ao que acabou por ser um interregno de dois anos de autenticação democrática de um poder na verdade exercido por um período dez vezes maior, e que como o tiro proclama esteve longe de ser um simples passeio nos jardins do Catete.

   Ou uma daquelas salutares caminhadas após a janta que o presidente costumava fazer pelas imediações do palácio e em que, segundo a lenda, certa noite cruzou com Graciliano Ramos, que morava num hotel a uma quadra do palácio. Imagine-se a tensão. O escritor alagoano fora seu preso político, sob a acusação não comprovada de pertencer ao Partido Comunista. Mas ao que se diz ambos se cumprimentaram com uma vênia sem interromper o passo.

   O tiro fecha a cortina sobre a aquarela getulista, que se pôs fim à dieta do café com leite no jogo de alternância governativa só mudou a embalagem do jogo das oligarquias políticas e/ou militares que mandam e desmandam através de consulados imperiais e republicanos há quase dois séculos. Como só obrigou o coronelismo nordestino a fazer umas poucas mudanças de fachada.

   Uma aquarela maculada de dor e sangue dos crimes da ditadura. Mas também laureada por banhos de multidão no Estádio São Januário ao som de megacorais orfeônicos regidos por Heitor Villa-Lobos e exaltações ao Brasil brasileiro e seu povo inzoneiro de olhar indiferente e ao Pai dos Pobres que criou a primeira lei trabalhista do país e deu impulso vital a sua indústria de base.

       Muda o sotaque, permanece o estigma.

   Após mais de um século o país bandeou-se do raio de influência do decadente sistema econômico britânico para o do quintalão da América.

   Os EUA saíram da I Guerra Mundial como a nova grande potência e sua influência torna-se desde logo preponderante no mundo das artes e dos espetáculos, a nascente indústria cultural de massas. Na era do jazz, bandas de choro e maxixe passam a fazer bicos também como jazz bands.

       Os ritmos populares urbanos cristalizam-se até a tomada do poder pelo ditador populista com tacões de ferro e um sorriso aberto e franco (ou cínico?) dos pampas. A qualidade dos discos melhora muito com o sistema de gravação eletrônica e o rádio, que rapidamente se difunde das metrópoles nascentes aos grotões de Lampiões acesos, logo descobre que sua vocação é fazer vibrar as multidões com a música a cujos ritmos, urbanos ou rurais, o Rio delirava, sobretudo em época de carnaval, cuja fama já dava a volta ao mundo. Com ela a Cinédia começa a ensaiar as primeiras imitações dos musicais de Hollywood. O cassino da Urca é uma pequena réplica da Broadway à entrada da baía de Guanabara. Surge o star system made in BrazilCarmen Miranda, a Garota Notável, Mário Reis, Francisco Alves, o Rei da Voz, Noel Rosa, Ari Barroso são astros de primeira grandeza num país sorridente e galhofeiro como Assis Valente ou prazenteiro como Dorival Caymmi, dois baianos da gema que dão mais consistência à falsa baiana Carmen Miranda. Que de esperta (diz-se também que antes de partir para Nova York não deixou de se fazer aconselhar pelo pajé do Catete) recusa-se a dar voz ao insolente telegrama em que o autor de Camisa Listrada anuncia

 

 o tio Sam está querendo conhecer a nossa batucada

andou dizendo que o molho da baiana melhorou o seu prato

 

   O Brasil tem petróleo, Borracha Para a Vitória Aliada e a grande embaixatriz do samba, uma inimaginável star carioca com sangue luso – por que não exagerar um pouco e carnavalizar o delírio de país do futuro nos tudo somado tristes trópicos? Porque como cantou o mesmo poeta agridoce do Brasil Pandeiro que um dia pensou até que todo mundo fosse filho de Papai Noel

 

     minha gente era triste, amargurada

    inventou a batucada pra deixar de padecer

 

       Samba & exaltação. Os EUA deram uma siderurgia de presente a Getúlio para que se deixasse de namoros com o nazi-fascismo e cedesse bases aéreas e navais no Nordeste para combatê-lo na África. O Brasil pode arvorar-se a viver uma versão jeca do american way of life. A pequena grande máquina do showbiz local segue o modelo americano e no início dos anos 1940 as massas amontoam-se na frente do edifício do jornal A Noite para ver de perto e eventualmente tocar e beijar e sei lá as grandes atrações dos programas de auditório da Rádio Nacional, animados por Manoel Barcelos e Paulo Gracindo, cujo bordão era domingo não é um dia qualquer mas um estado de espírito.

       Para uma Variety nova-iorquina uma Revista do Rádio de sabor muito local. Anos getulistas, Época de Ouro da música – popular e não só, porque também havia Villa-Lobos, o índio que conquistara o Hemisfério Norte de casaca e chinelos de quarto.

 

       O epíteto Época de Ouro irrita os de martelo e bigorna mais sofisticados. Afinal grande parte do repertório e das interpretações era inegavelmente brega. Breguíssima. As vozes com muito vibrato e impostações operísticas, de que Vicente Celestino e seu maior sucesso, O Ébrio, são exemplos emblemáticos. Reis do gogó e do dó de peito, dor de cotovelo ou de corno.

   Muito brega até mesmo numa composição do maestro Pixinguinha com letra de Octávio de Souza, Rosa, e mesmo quando pela voz de um dos primeiros oradores modernos da canção brasileira, Orlando Silva, o Cantor das Multidões.

   E o que dizer do que vem a seguir, na década de 1950.

   Mas fazer o quê? – aquele foi também o período de cristalização de uma fortíssima tendência de mercado na nascente sociedade de massas brasileira, então como agora jeca pra chuchu. Sem dúvida, bastante mais autêntica na sua jequice.

   Época de ouro do nec plus ultraCarmen elle-même, Mário Reis, Pixinguinha, Orlando Silva, Caymmi, Noel e outros muitos – e do ultra kitsch local.

            Dirá a cantora Elis Regina sobre o período em que, enquanto para os getulistas Carlos Lacerda dá munição ao para os lacerdistas cruento ditador populista para que desça do trono e entre de uma vez por todas na história, Francisco Alves ou Chico Viola já morava no céu dos Reis da Voz e o grande agitador das massas nas tardes de sábado na Rádio Nacional era César de Alencar:

 

       A música brasileira que havia antes de 1957 não tinha gabarito sequer para ser tocada em casa de família. Edredom Vermelho, A Luz Difusa do Abajur Lilás são músicas nitidamente de bas-fonds. Minha mãe não me deixaria comprar um disco de Nelson Gonçalves, que era ídolo naquela época. Nessa companhia estavam Adelino Moreira e outras pessoas. À exceção de Agostinho dos Santos a gente não tinha a quem ouvir. Elizeth Cardoso, raramente.

 

               Ela é fã de Emilinha

               Não sai do César de Alencar

               Grita o nome de Caubi – CAUBI!

               E depois de desmaiar

               Pega a Revista do Rádio

               E começa a se abanar

 

                                                   Fanzoca do Rádio

                     Miguel Gustavo

 

      Um pouco da história desse período encontra-se no romance A Estrela Sobe (1938), de Marques Rebello, escritor que marcou com sua morte em 1973 o fim de um estilo de literatura urbana carioca iniciado com Manuel Antônio de Almeida e Memórias de Um Sargento de Milícias e prosseguido nos oitocentos e início dos novecentos por escritores como Machado de Assis, Lima Barreto, Graça Aranha e Benjamin Costallat. A Estrela Sobe, que fala da vida carioca no período áureo da radiodifusão, com seus romances, ídolos e gritos peculiares, foi tema do primeiro filme de Bruno Barreto (1974).

 

       Foi para o quarto dar um ponto na blusa; precisava mudar a gola para outra renda, que já comprara. A porta ficou aberta, seu Alberto chegou, mas não entrou:

   - Decorou a letra da canção, dona Leniza?

   - Ah, seu Alberto! Não tive tempo. Mas é coisa à toa. Hoje mesmo eu decoro. Num instantinho eu acabo isto e vou para a sala esganiçar um pouco.

   - A senhora vai longe. É só querer.

   Leniza sorriu. Dentro do peito se agita a amargura que se recalcara – ser artista do rádio. Ultimamente, esforçando-se, caprichando, se exercitava muito com seu Alberto.

       Acompanhava no rádio o movimento do broadcasting nacional. Sabia de tudo o que se passava. Pensava em comprar um rádio a prestações.

 

       Anos 30 para os 40. A cidade, da fisionomia belle époque do início de século, começa a tomar ares de moderna metrópole americana, com pouco do que isso poderia ter de bom e muito do que tem de negativo, mormente a mão da especulação imobiliária sobre cada uma delas. Época de Ouro, então, da música brasileira e do Cassino da Urca e suas grandes atrações, como Carmen Miranda, mas também da nascente avalanche centro-americana, através de astros como Pedro Vargas – usted se lembra?

       A publicação de A Estrela Sobe coincide com a fase de levantamento de dados de Tristes Tropiques e de levantamentos de dados e redação de Brasil, País do Futuro.

   Talvez porque Claude Lévi-Strauss tivesse dado um tempo até justamente o suicídio de Vargas – que também aos seus olhos terá ensombrado as perspectivas do país – para escrever o que afinal é um estudo de antropologia estrutural, certo é que o espírito que emana dos escritos do francês nas suas considerações gerais sobre o Brasil em Tristes Trópicos é totalmente diverso do que flui no roteiro histórico-paisagístico do austríaco, que quando decide aceitar um convite do governo Vargas para visitá-lo era um dos  escritores mais famosos do mundo, por romances como Amok e biografias de grandes vultos históricos.

   Lévi-Strauss chega a chocar no trecho celebrizado por Caetano Veloso em O Estrangeiro em que compara a visão da entrada da baía de Guanabara – invariavelmente tida como uma das mais belas do mundo -, o Pão de Açúcar, o Corcovado, todos esses pontos tão elogiados, com raízes de dentes quebrados na boca banguela. Choca, mas não sem antes manifestar o seu embaraço por ter de confessar que, apesar da sua tantas vezes célebre beleza, a cidade causa-lhe engulhos.

   Após o choque, pouco papo. Seu negócio é ciências humanas e propõe-se fazer apenas um sobrevôo do país e dos seus principais centros civilizacionais antes de mergulhar no cenário em que estuda os remanescentes dos povos indígenas no Paraná e Mato Grosso. Quem sabe também em função dos ecos ouvidos em Paris do tiro atrás dos reposteiros da ala residencial do palácio do governo no Rio de Janeiro, lacônico como deve ser um maître à penser do seu tipo, Lévi-Strauss expõe instantâneos sombrios do país.

   O esplendor natural do Rio de Janeiro ter-se-á ofuscado para ele na alvorada da integração da baía de Guanabara à civilização com o episódio – que segundo ele mesmo daria um belo filme – em que, do paraíso ecumênico do projeto à partida em Dieppe, a França Antártica de Villegaignon torna-se de imediato cenário de disputas acérrimas entre católicos e calvinistas, a ponto de quase chegarem à antropofagia não-ritual. Sinal forte o bastante para se pensar que cenário por si só – mesmo que o fascinasse - não é NADA. Algo assim como o sentimento exposto por Tom Jobim em Inútil Paisagem.

   São Paulo no final da década de 1930 fornece-lhe a imagem-símbolo de resto cada vez mais fundamentada do Brasil: um país em que a civilização decai antes de atingir o apogeu.

   Em dois pontos a brevíssima exposição de Lévi-Strauss e a derramada narrativa histórico-paisagística de Zweig são afins.

   Quando falam da diferença abissal entre se viver com pouco dinheiro na Europa ou em Nova York e no Rio de Janeiro, segundo raciocínios do tipo: na falta de uma bela bisteca sempre há banana e abacaxi pra chuchu e a preço de banana.

   E quando falam das favelas.

   Favelas – explicam ou depreende-se – nas colinas ao longo da costa de entrada da baía, como o atual favelão do morro de Tavares Bastos, nas costas do Flamengo, ou já na Gávea, à época  amontoados de duas ou três dúzias, se tanto, de casebres de tábuas e zinco, e talvez Estácio, Mangueira e zona do cais do porto.

   Claude Lévi-Strauss:

   Talvez o urbanismo já tenha resolvido o problema, mas em 1935 no Rio o lugar ocupado por cada um na hierarquia social media-se com o altímetro: quanto mais baixo mais alto estava o domicílio. Os miseráveis viviam pendurados na desolação, nas favelas, onde uma população de negros vestidos com farrapos bem deslavados inventava com o violão essas melodias vivazes que, em época de carnaval, desciam das alturas e invadiam a cidade com eles.

   Zweig aproveitou o convite do governo Vargas para conhecer mais um possível refúgio de emergência da abibolada Europa dos Ditadores (.Aldous Huxley) e da perseguição aos judeus – o povo do casal austríaco – e acabou por encontrar no que se lhe afigurou uma espécie de paraíso o endereço alternativo à América lá de cima, que já estava sendo superpovoada por artistas e cientistas, judeus e não judeus, foragidos da guerra iminente. E no relato de viagem que escreveu a seguir  derrama-se em elogios à Boa Terra (no caso, Bahia e Brasil em geral) enquanto prepara a mudança. Mas o paraíso e de passagem, também, país do futuro não bastou. Em menos de dois anos o casal Zweig suicida-se no seu refúgio paradisíaco em Petrópolis, quando a guerra também já se aproxima dele.

   Stefan Zweig sobre o mesmo tema de Lévi-Strauss:

   E como esses casebres estão situados no alto dos morros, nos mais inacessíveis recantos, têm a mais bela vista que se pode imaginar, a mesma vista que têm as mais caras vilas de luxo, e é a mesma natureza luxuriante que orna seus lotezinhos com palmeiras, e generosamente lhes dá bananeiras, essa maravilhosa natureza do Rio, etc.

   Vê-se pelo trecho que, tomada do mesmo ângulo, a perspectiva de Zweig chega a ser oposta à do cáustico mas preciso antropólogo francês.

   Ambos estão de acordo sobre a impossibilidade de manutenção desse estado de coisas do ponto de vista urbanístico e social. Uma mudança - pressupõe Lévi-Strauss duas décadas após a chegada ao Brasil - teria sido mais que provável. E todavia não foi, muito pelo contrário...

   O entusiasmo inicial de Zweig com o Novo Mundo a sul do Equador, onde não existe pecado (ladainha que também recita no seu livro), é tão grande que o trecho acima insere-se no subtítulo

 

   Algumas coisas que talvez

            amanhã tenham desaparecido

 

e escreve com convicção no final da abordagem do tema:

   Com essas favelas desaparecerá uma parte interessante, um pedaço incomparável do Rio, e quase não posso imaginar os morros da Gávea (olha a Rocinha nascendo aí, gente!) e outros sem esses pobres casebres, colados na rocha, que com o seu primitivismo lembram quanto de supérfluo temos e exigimos.

   Também outra originalidade do Rio em breve será vítima da ambição civilizadora... etc.

   O que espanta pela perspectiva dos dois ilustres visitantes em 1939-40 (Zweig, cujo anúncio da Terra Boa é feito quando Paris já está quase em chamas) e 1955 (Lévi-Strauss) é como a cidade não seguiu a (não só) sua lógica e as favelas transformaram-se em cidadelas e daqui a nada talvez se transformem num inferno com algumas semelhanças com as cidades européias sob assédio e ocupação nazista.

 

   Um e outro aspecto das perspectivas Lévi-Strauss-Zweiguianas, da vida no Rio entre os anos 1930 e 1960 e a da atualidade (troque-se os colunistas Thormes, Ibrahim e Chavs e os colunáveis Didu, Teresas e Dolores por Caras & outros emergentes que tais), a disparidade entre o que está no alto e o que está embaixo e da luz do dia e da luz da Light, reflete-se numa colagem feita por Maria Bethânia em show na Boate Barroco em 1969:

 

Pano Legal – Billy Blanco

 

Certo dia fui levada

a um samba diferente

entre a gente da gravata

e do plastron

ai, ai

 

Bebida servida em taça

champanhe em vez de cachaça

mesmo assim o samba

lá é bom

 

Eu vi muita granfina bonita

rebolando, sambando, sambando

não sabia que as distintas

eram assim

 

Se eu soubesse como era

o ambiente, decente

jogava um pano legal

por cima de mim

 

Café Society – Miguel Gustavo

 

   Doutor em anedota e de champanhota

 estou acontecendo no café society

   Só digo enchanté, muito mercy, alright-i    

   troquei a luz do dia pela luz da Light

 

   Agora estou somente contra a dama de preto  

 Nas dez mais elegantes eu estou também

   Adoro o riverside e só pesco em Cabo Frio

 Decididamente eu sou gente bem

 

 Enquanto a plebe rude na cidade dorme

 eu danço com Jacinto que também é de Thormes

 Teresas e Dolores falam bem de mim

 Já fui até citada na coluna do Ibrahim

 

 E quando me perguntam como é que pode

 mamãe de black-tie dançando com Didu

 eu peço mais um uísque embora esteja pronta

 Como é que pode? – Nina Chavs conta

 

             Numa época em que o mundo parece ainda muito longe da aldeia global – como se depreende da própria visão de Zweig de uma região  estanque e que deveria passar incólume pelo novo flagelo bélico numa Europa ensandecida – não foi difícil para o eficiente DIP (Departamento de Informação e Propaganda da ditadura Vargas) manter o grosso da população a néris da situação política de lascar que mutatis mutandis iria desembocar na forma de projétil do cano de uma arma para o peito do então presidente democrático. Não faltavam também matérias, como as leis trabalhistas e mais tarde a construção da usina siderúrgica de Volta Redonda, para rechear a pauta de propaganda pró-regime, enriquecida por sambas-exaltação ao país e ao presidente que os melhores compositores iam fazendo. Entre muita briga e tensão nos bastidores engrossando o caldo e, na passada, muita tortura e morte também.

   Mas o que mais se refletia na arte popular que se tornara também uma indústria, além da subida em flecha da influência do novo Império através da música e do cinema, era o gozo da vida e a gozação com os seus percalços, mesmo quando, como em O Orvalho Vem Caindo de Noel, tenho passado tão mal, a minha cama é uma folha de jornal. Tudo somado, no país do futuro, havia motivos de sobra para todo tipo de esperança.

 

       O sono custou a chegar para Leniza – ser cantora do rádio!... e quando acordou, no outro dia, não foi outro o seu primeiro pensamento – ser cantora do rádio!...

 

       Fechemos o foco no universo e cenário da Leniza Méier de Rebello para uma visão de interiores e exteriores de um mundo fixado em imagens como as da Coleção Galante, Coleção Chique, Jornal de Modinhas, do Álbum do Seresteiro, de A Lira do Povo e do espíquer do rádio do vizinho.

       Rio-capital num traveling em marcha pelo Flamengo em plena Avenida Beira-Mar – quando sequer se sonhava ainda com o Aterro - vendo ao longe o Pão de Açúcar encoberto, entrando num sorvete-dançante ou seguindo às Laranjeiras e subir o Silvestre, olhando cá para baixo, para a enseada de Botafogo, o casario, a fita das praias de Niterói, o Pão de Açúcar...

       Os engulhos que a paisagem natural, urbana e humana do Rio provoca no antropólogo levam Claude Lévi-Strauss a em momento algum do início ao fim do seu breve relato sobre a Guanabara abdicar do mais profundo rigor na escolha do mot juste, mesmo quando se detém um pouco no que a quaisquer outros olhos seria um cenário magnífico para um jantar num terraço no Silvestre ou nas Paineiras,

... sobre uma mistura incoerente de edifícios de concreto, casebres e conglomerados urbanos; com, ao fundo, no lugar de chaminés de fábrica que esperávamos como limite dessa paisagem incomum, um mar tropical, brilhante e acetinado, sob um luar monstruoso.

   Aspecto muito curioso em ambos os relatos é que para ilustrar sua visão de um ou outro trecho da cidade ou facetas humanas da mesma ambos falam de meio mundo, ou no mínimo três quartos dele, de Bombaim (já então, muito apropriadamente, Lévi-Strauss) à Polinésia, Havaí, Londres, Paris, Berlim, Marselha, Buenos Aires, Roma, Barcelona, Viena e Nova York.

   O que mais importa no entanto é captar a paisagem de um Rio de Janeiro que em quase todos os trechos mencionados também por Marques Rebello não existe mais, ou subsiste apenas em um ou outro vestígio.

   Botafogo, no final da avenida Rio Branco – encurta com a distância no tempo o antropólogo –, é ainda um bairro de luxe, mas depois do Flamengo nos pensaríamos em Neully e perto do túnel de Copacabana parecia, há vinte anos, Saint-Denis ou Le Bourget, com uma faceta de campo a mais, como poderia ser a nossa periferia antes da guerra de 1914. Em Copacabana, hoje crivada de arranha-céus, descortinei apenas uma cidade de província com seu comércio e suas butiques.

   O passeio de Zweig é em marcha muito lenta e de lés-a-lés, do Méier, então nos limites da zona norte, ao Joá, já sobre a avenida Niemeyer, que no entanto era apenas uma estradinha à beira mar e não uma via rápida suspensa sobre ele, sendo então tempo de menina vai com jeito se não um dia a casa cai se alguém te convidar pra tomar banho em Paquetá, um piquenique na Barra da Tijuca ou pra fazer um programa no Joá.

   Na senda inicial de Rebello, depois da Praça Paris, por alturas do Hotel Glória, a rua estreita (início da Avenida Praia do Flamengo) se aproxima do mar. Nela existiam outrora as antigas residências distintas, as quais, com um ou dois andares, cercadas de jardins, olhavam, modestas, para a baía. ... Edifícios de onze e doze andares erguem-se ali e as palmeiras gigantescas, que eram mais altas do que os antigos prédios, já quase não chegam ao peito dos novos. ... E, novamente uma curva, estamos em outra enseada, a de Botafogo. Já não temos a vista ampla, cremos estar à margem de um lago cercado por morros e estamos entre outros morros e outeiros.   ... Nesta multifária cidade o mesmo mar e a mesma montanha, em virtude da indescritível variedade das perspectivas, parecem sempre novos e surpreendentes.

   Lévi-Strauss e Zweig falam de uma cidade de todo modo ainda bucólica mas em plena transformação, com prédios suplantando palmeiras e arranha-céus contra um luar monstruoso.

   Do Méier ao Mangue e do centro ao Joá e ao recém-inaugurado Cristo Redentor, Zweig não menciona a pequena África, na expressão de Roberto Moura, que se espalhava da Praça Onze, embaixo do morro do Estácio, à Candelária e de lá à antiga Rua Mata-Cavalos, que servia de corredor de acesso a São Cristovão, nas proximidades do conjunto de morros da favela da Mangueira. Entre o morro do Livramento, acima da antiga Mata-Cavalos, e os outros extremos uma afinal vasta região de cortiços e quintalões que fora o berço e era o universo do samba e que começava a ser desocupada e destruída para a abertura da Avenida Presidente Vargas, o ditador que o acolheu.

   Entre Viena da Áustria e Hollywood mundos totalmente divergentes em questão de estilo. Sua presença no Brasil era afinal também uma questão de Estado, como foi a do diretor de cinema Orson Welles em 1942. Welles chegou ao Rio no início de fevereiro para filmar o carnaval, duas semanas antes de o casal Zweig pôr fim às suas vidas que a ele se terá afigurado como de judeus errantes ou condenados ao forno crematório. Um escritor à moda antiga, da extirpe aristocrática de Stefan Zweig, dificilmente se envolveria com batucadas e magia negra como o homem-do-mundo Welles, que fez questão de carregar por toda a vida o lendário estigma do mau-olhado de um pai-de-santo carioca como desculpa para os desaires das filmagens de It’s All True/É Tudo Verdade.

   A abertura da Presidente Vargas parecia ser e terá sido mesmo a pá de cal sobre a africanidade carioca, com tons verdadeiramente apocalípticos: Vão acabar com a Praça Onze, não vai haver mais escola de samba, não vai.

   Após a primeira leva no início do século com a abertura da Rio Branco, com que cruza, a larga avenida foi o pé de arrimo da cruz funerária que se sobrepôs a esse mundo e que obrigou os negros que ainda ali moravam a ir procurar abrigo nos morros das cercanias e de outras regiões da cidade, cujas favelas duplicaram de tamanho. E depois aumentaram ainda mais e mais ainda. Encerra-se ali a fase seminal da história do Rio, que culminara com a faceta belle époque, de brancos presunçosos que se vestiam à européia em plenos trópicos, negros com a memória da África em erupção pelos poros e mestiços metidos a isto e a aquilo – e muito metidos. Os cariocas da gema, enfim. Que involuntariamente ajudaram a transformar o Rio, nos melhores trechos, numa quase favela.

 

   Vai um dia, vai uma semana, um mês. Vai o inverno, o verão. As mesmas festas, nos mesmos clubes, os mesmos cinemas. Os amiguinhos é que mudam. Não suportava uma semana a mesma cara, a mesma voz, os mesmos beijos. Vem o Carnaval, fantasiou-se de camponesa russa – que loucura! Para as noites de casa tem os romances, as revistas, os jornais dos hóspedes. Tem o rádio do vizinho também. É desgraçado de fanhoso, mas é rádio. Tem o seu Alberto sempre amigo, amigo de violão, sempre animando-a:

 

   - Que linda voz!

   - Pelo senhor eu já estava na rádio, não é, seu Alberto?

   - Por que não? Há muitas piores que lá estão.

 

  Em 1973 Sérgio Cabral, Millor Fernandes, Jaguar, Ziraldo e Albino Pinheiro entrevistaram Marlene para o jornal Pasquim. Duas décadas depois do apogeu como Rainha do Rádio e uma das figuras de maior destaque do elenco da Rádio Nacional a cantora consolidava o sucesso de crítica e público como atriz na primeira montagem da peça Botequim, de Gianfrancesco Guarnieri, depois da revelação em Greta Garbo, Quem Diria, Morreu no Irajá.

   Close para uma edição da Revista do Rádio de 1960, quando esse tipo de muvuca já estava no fim, e da capa com uma Maysa para variar sorridente para títulos como

 

Esse broto manda (mesmo!) em Agnaldo Rayol

      Cauby Confessa Quanto Ganha e Quanto Gasta

    Francisco Carlos, Sem Hesitações:

                   Não Tenho Medo de Ninguém

 

       No império da Rádio Nacional, Rádio Tupy e Rádio Mayrink Veiga os cantores contratados por cachê mensal em regime de exclusividade trabalhavam até seis horas por dia gravando e estrelando programas de auditório, disputando índices de popularidade e audiência baseados, para o público externo, no eterno jogo frívolo da ciumeira e rivalidade entre os artistas, o do puxa-e-estica da sobrevivência através da publicidade hoje dominante na televisão. Tudo jogo de cena, um ou outro com grandes talentos.

   

   - A senhora também não acha, dona Leniza?                                   

Leniza acorda:

   - O quê?

   - Que não há outra igual a Carmen Miranda.

   - Que dúvida!

   Dona Manuela não acha. Gosta dela, sim, mas gosta mais de Araci Cortes. Acha-a mais mimosa. Tinha-a visto no teatro, há muito tempo, poucos dias antes de o marido cair entrevado, coitado. Muito mimosa. Seu Alberto ria.

   - Qual, dona Manuela, a senhora está muito atrasada. A Araci é material da monarquia.

       Dona Manuela dá um muchocho de quem não acredita – que esperança! Leniza está longe outra vez. Cantar no rádio! Por que não? Ir lá, cantar pra eles... Seu Alberto tinha razão. Ir lá. Tinha voz. Tinha jeito... Quantas piores?

 

       Qualquer Sou Uma Ave Noturna ou Gastei Todo o Meu Amor Com Um Homem Só, que Leniza passou a cantar, não está muito distante da incrível dica que se encontra nas páginas amarelecidas de exemplares do Jornal de Modinhas e Vamos Cantar da década de 1950.

   Ivon Curi em ritmo de tango dizendo que em vontade de mulher, a mais honesta que tiver, ninguém pode confiar, Cauby Peixoto num bolero lançando a sua Súplica, Adelino Moreira escrevendo que se ele te disser que já fui sua, não creias meu amor, não deves crer, Silvinho em Mais um tango, mais uma bebida (para esquecer a vida), Altemar Dutra declamando maldito seja o amor o alucinado amor que me prendeu e Elizeth Cardoso implorando: Culpa-me.

   Nelson Gonçalves se queixando por palavras de Adelino Moreira

                            doidivana, quem calunia

           não sabe a agonia

           que passo e passei

           não ouviu tua voz quente e rouca

           não beijou essa boca

           que eu tanto beijei

e Lupicínio Rodrigues apontando:

           quem há de dizer

           que quem vocês estão vendo

           naquela mesa bebendo

           é o meu querido amor

    

           repare bem cada vez que ela fala

           ilumina mais a sala

           do que a luz do refletor

 

           o cabaré se inflama

           quando ela dança

           e com a mesma esperança

           todos se põem a olhar

 

           e eu, o dono

           espero louco de sono

           aqui no meu abandono

o cabaré terminar

pela voz de Francisco Alves.   

   Herivelto Martins falava então da Madrugada, que Elizeth cantava. Orlando Silva sambava dizendo eu sou o sol, ela é a lua, quando eu chego em casa ela já foi pra rua, Silvinho expirava: Quando eu morrer no outro mundo esperarei por ti. Fred Jorge, futuro autor de sucessos de Roberto Carlos, traduzia e adaptava rocks para Celly Campello. Gordurinha dizia a sua afirmando que você quer estrear no amor e eu já estou cansado; pra você isso é um recomeço e pra mim um final, enquanto Emilinha Borba, na fossa em disco de meio do ano, chorava:

              a noite é triste

              triste é a minha canção

              luar não há

              e é grande a minha solidão

Miltinho se esbaldava:

                  Você mulher

                  que já viveu

                  que já sofreu

                  não minta

 

                  é bom sonhar

                  sonhemos nós

cantando uma Mulher de 30.

     Lupicínio Rodrigues no auge interpelando Se acaso você chegasse no meu barraco (ou chateau) e encontrasse aquela mulher que você abandonou e um outro como que se desculpando (a ela):

           gostar de ti sempre foi meu lema

           sempre foi satisfação

           mesmo saindo com outra

           eu te carrego no meu coração

e Carmen Costa, orgulhosa, tirando o corpo fora

Ele é casado

e eu sou a outra na vida dele        

que tudo faz numa brasa

por lhe faltar tudo em casa

       Ele é casado

       e eu sou a outra que o mundo difama

       e que a vida ingrata maltrata

       e sem dó cobre de lama

 

       Quem me condena

       como se condena uma mulher perdida

       só me vê na vida dele

       mas não o vê na minha vida

       Não tenho lar, trago o coração ferido

       mas tenho muito mais classe

       do que quem não soube prender o marido

para tudo culminar com Maysa dizendo:

       nosso amor tem raízes profundas

       quem olhar em teus olhos me vê

   - O senhor é advogado?

   - Sou. (Era contador.)

   - E tem muitos causas?

   - Nunca tive nenhuma, senhorita. Nenhuma, e riu: Uma falta de vocação absoluta!

   - Mas então o que é que o senhor faz?

   - Vendo aparelhos de rádio.

   Ela se iluminou:

   - Rádios?!

   - Sim, rádios. (Que havia nisso de tão extraordinário para tanto espanto?!) Tenho uma pequena casa distribuidora. Dá para viver.       Quer dizer que o senhor conhece essa gente toda do rádio, não é?

   - (Ah! Parecia compreender...) Não há relação nenhuma entre uma coisa e outra. Mas conheço alguns artistas. Tenho também alguns amigos nas estações, na parte técnica, compreende? Na Rádio Metrópolis, por exemplo, o diretor é muito meu amigo. Por quê? Tem alguma pretensão?

                     Leniza pensava: Caiu do céu! – mas respondeu:

   - Não. Não tenho nenhuma. Perguntei à toa. Pensava que essa  história de rádio fosse tudo uma geringonça só.

 

   A transa musical naqueles tempos (Leniza lá nos anos 1930, esse pessoal no dos 50) não era só na base da dor de cotovelo, ou para ser mais preciso, de corno. O sambista Pedro Caetano perguntava:

                            desta vez vamos pra onde morena?

 e a morena rebatia:

      sei lá, sei lá, não sabemos onde estamos

           quanto mais para onde vamos

 e no samba Cavalo de Inglês intimava:

           Mulher perde a mania

           de tomar café com pão

           depois vê se acostuma

           sem arroz e sem feijão

 

           Mulher vamos fazer

           como o cavalo do inglês

           para ver se sobra algum

           no fim do mês

 

           A vida está boa... pra eles

           Está tudo barato... pra eles

           Eles quem? O melhor é não dizer

           Cala a boca, mulher, não liga não

           Que eles podem me prender

 

       Sambas-exaltação eram outra estória. Imagens estereotipadas sobre arquétipos o mais das vezes sem fundamento em linguagem pomposa para impressionar iletrados. Carmen Costa cantava O Samba do Brasil convocando

              vem mostrar o samba

              esse batuque tão viril

              vem, vem mostrar que

              ainda és bamba

              vem sambar Brasil

 

              faz descer o morro

              abandona o barracão

              ouve esse grito de socorro

              do meu coração

 

              vem Brasil

              para o terreiro, traz cuíca

              traz pandeiro

              cavaquinho e violão

                

              cantem rios e cascatas

              para que as nossas mulatas

              a sambar de pés no chão

              pisem com malemolência

              sempre dentro da cadência

              sob o som do tamborim

 

              samba, meu Brasil

              por um segundo e mostra

              aos olhos do mundo

              que o nosso samba é assim

 

quando Lamartine Babo já orquestrava e encenava uma Ressurreição dos Velhos Carnavais

              os clarins

   estão relembrando os nossos velhos carnavais

              arlequins

              sensuais

              amam colombinas de pompons grenás

              passam na visão dos meus sonhos

              os pierrôs tão tristonhos

              a tocar bandolins entre ais

              implorando em vão

              a ressurreição

              desses velhos carnavais

numa época em que ainda havia muito desses carnavais no carnaval carioca. Linda Batista abria o leque para explanar um outro tipo de preocupação em relação ao tema quando o Rio começa a despedir-se do status de capital do país do futuro:

              dizem

              é voz corrente

              em Goyaz será a nova capital

              leve tudo para lá seu presidente

              mas deixe aqui o nosso carnaval

 

              O sorriso do Getúlio

              o Brasil não esqueceu

              e dizemos com orgulho

              que Getúlio não morreu,

insistia-se entretanto no flashback numa Sublime Evocação.

       Exaltação era já uma fórmula gasta, recalcada nos seminais e antológicos modelos de Aquarela do Brasil ou Baixa do Sapateiro, de Ari Barroso. Tal como é retomada em todos os arquétipos estereotipados ou chavões de propaganda turística em A Bahia Te Espera, de Herivelto Martins e do jornalista, dramaturgo e cineasta luso Chianca de Garcia, que Maria Bethânia relançou no seu LP Pássaro Proibido, de 1976:

 

                  A Bahia da magia

                  do feitiço e da fé

                  Bahia que tem tanta igreja

                  e tem tanto candomblé

 

                  Pára de buscar

                  nossos saveiros

                  já partiram para o mar

                  Iaiá Eufrásia

                  Ladeira do Sobradão

                  tá preparando seu candomblé

                  Iaiá Damásia

                  na Ladeira do Mamão

                  tá preparando acarajé   

 

                  Pára de buscar

                  nossos saveiros

                  já partiram para o mar

                  nossas morenas

                  roupas novas vão botar

                  se tu vieres irás provar

                  do meu vatapá

             se tu vieres viverás nos meus braços

                  a festa de Iemanjá

 

                  Vem, vem, vem

                  vem em busca da Bahia

                  cidade da tentação

                  onde o meu feitiço impera

                  vem se me trazes

                  o teu coração

                  vem que a Bahia te espera

 

                  Bahia! Bahiiiaaa!

            

       Foi uma tarde de exaltação. Mário Alves esperava-a na esquina do Alhambra. Ela chegou ofegante:

   - Desculpe o atraso. E então?

Mário Alves tinha boas notícias. Falara com o Porto, que prometera se interessar por ela. Era o diretor de broadcasting da Metrópolis. Ele é que selecionava os artistas, organizava os programas, era o manda-chuva lá, em suma. Fosse com ele, que iam bem. Ia marcar uma tarde para fazer uma prova.

   - Mas quando vai ser isso?

   - Esta semana ainda.

   - Não diga!

   - Certo.

   - Você é um anjo!

   - Talvez...

   Leniza deu-lhe o braço:

   - Me aguente que eu não me aguento.

   - Nervosa?

   - Feliz!

   - Não sei, e ele riu, mas para mim você vai longe.

   - Deus te ouça, meu filho, disse ela séria.

   E mais séria ainda perguntou: E ele falou em dinheiro?

 

   

Como numa pausa para retomada de fôlego após todo o bulício dos anos 1950-60, no início da década seguinte o mundo ocidental foi inundado por uma onda de moda retrô e no Brasil o revivalismo dos anos 1930-40 teve terreno fértil pela força expressiva dos repertórios daqueles tempos. Humphrey Bogart, E O Vento Levou e Bing Crosby voltaram aos telões, restaurados, enquanto no Rio seu antigo diretor de cena Carlos Machado montava um show chamado Cassino da Urca, Lupicínio Rodrigues voltava ao disco e aos palcos e Paulinho da Viola e Gal Costa gravavam antológicas versões de chefs-d’oeuvres do seu repertório, Nervos de Aço e Volta, Nora Ney – com Maysa uma das figuras de proa do gênero canção de fossa do início dos anos 1950 - também ressurgia em disco, como Emilinha Borba e Marlene – as duas grandes rivais da última fase da época de ouro do rádio - tentavam reavivar as marchinhas de carnaval, Bethânia gravou Bom Dia, de Herivelto Martins, e Volta Por Cima, de Paulo Vanzolini, e Marlene – lançadora de sucessos que perduram como Lata D’Água e Mora na Filosofia, de Monsueto (de quem Caetano Veloso por sua vez retomava Mora na Filosofia e Eu Quero Essa Mulher Assim Mesmo, para com esta fazer uma espécie de levanta-coreto hard rock), revivia seus tempos de estrela muito kitsch como Tita La Cafona na peça A Dama de Copas e o Rei de Cuba, de Timochenko Wehbi, em que deixava a cena relembrando uma coqueluche dos tempos áureos de cantora: Nega, mueve tu cintura!

 

   - Como o final da peça é quase um show musical, talvez no antigo estilo dos auditórios, muita gente me pergunta qual a diferença entre aquele público frenético da Rádio Nacional e as comportadas platéias teatrais. Quer saber? São todos macacos de auditório, no bom sentido. O público não muda. As reações das pessoas são as mesmas no (Teatro) Municipal ou no Maracanã.

 

              pocotó, pocotó, pocotó...

  passamos a apresentar...

                   Jerônimo, o Herói do Sertão!...

               ... pocotó, pocotó, pocotó...

 

     

   Em meio a onda de revival pôde-se então pela primeira vez reviver momentos hilariantes do período áureo da Rádio Nacional através do lançamento em disco de vinhetas e trechos dos seus programas mais célebres, com o sacrossanto brado Emilinha Borbaaa! de César de Alencar, os tambores e trombetas e a voz de Heron Domingues no Repórter Esso, a mais famosa rádionovela da Era Dutra-Vargas, Jerônimo, o Herói do Sertão, o programa humorístico Balança Mas Não Cai e atrações como Primo Pobre e Primo Rico, que deram pé até na TV anos depois, ou a tétrica vinheta de abertura da ela mesma hora áurea do revival do broadcasting nacional, quando após sua morte num acidente de carro na Via Dutra os ouvintes eram convidados a reviver - ... ao soar das doze badaladas... de meio-dia – a voz do Rei da Voz, o popularíssimo Chico Viola. Além de gritos e urros entre sensações de faniquitos de fãs que só tiveram igual anos antes com o fenomenal impacto de Frank Sinatra junto das lolitas norte-americanas e uma década depois com os Beatles.         

     Foi uma noite serena. Leniza sente-se segura do seu destino. Seu Alberto veio com o seu violão, sentou-se na cadeira habitual, correu os dedos magros pelas cordas, convidou-a com um virar de cabeça – vamos? Vamos, como não! Mas antes tinha uma novidade para ele. Uma novidade do barulho. Seu Alberto estava querendo adivinhar.

   - Será o que eu penso, dona Leniza?

   - É, é... ria, caindo para trás da cadeira. Deve ser, seu Alberto.

     Ele exultou sinceramente:

  - Mas como foi, dona Leniza? Como foi? Conte.

  - Ainda não foi, seu Alberto. Mas está quase. Por nadinha.

  Seu Alberto queria saber tudo. Estava ansioso. Contasse.

  Tinha se apresentado, como ele aconselhara? Tinha? Como era? Ficou sabendo que ela não se apresentara – ia ser apresentada. Tinha um bom pistolão. Um senhor muito conhecido, de muita influência.

 

   Macacos de auditório... À época do revival dava até para pensar que aqueles talvez tivessem sido realmente os bons velhos tempos. Mas, longe disso, com a guerra da Coréia logo após a II Grande Guerra, o pesadelo nuclear, presidentes que se imolavam em pleno palácio de governo... hão de ter sido à vera a chocadeira de futuros pesadelos.

 

       (É artista de rádio, afinal. Custou, mas foi. Seiscentos mil-réis por mês! Parece um sonho! Vestidos, sapatos, chapéus, perfumes – a vida! A vida tal como ela queria, como ela compreendia. A vida e a glória. Retrato nos jornais, nas revistas, falada, comentada, apontada. Tudo o que é bom, tudo o que enche o coração, tudo o que ela vinha amarga e secretamente desejando, lhe caía nas mãos, afinal, naquele dia tão lindo, tão azul, o mais feliz da sua vida! Sentia-se forte, única, respirava um ar diferente, um ar de conquista, de liberdade, de independência!)

 

    À época do revival da era de ouro, no auge da ditadura militar que sucedeu a apenas cinco anos de aparente bonança, confiança e progresso e outros quatro de convulsões após o tiro que ficou na história, Edu Lobo planejava compor uma peça musical sobre a Era Vargas a partir da história do rádio naqueles anos, Luiz Gonzaga Jr. rememorava outra das suas grandes atrações de outrora - O Trem da Alegria partiu agora neste instante da Rádio Nacional, a gare principal da Central do Brasil - em A Felicidade Bate À Sua Porta e o que terá sido um dos aspectos mais positivos dessa frenética atividade, o envolvimento nela de dezenas e dezenas de músicos de altíssimo gabarito e à frente deles maestros como Radamés Gnatalli, Lírio Panicalli, Leo Peracchi e Lindolfo Gaya, enquanto no bolero de Gonzaguinha namora-se bor-bo-le-tando no salão grená ao som da orquestra de Waldir Calmon, feita pra dançar.  

 

 

 

nostalgia, meu bem  

 

    

ao som da orquestra de Waldir Calmon, feita pra dançar  

                                 - Luiz Gonzaga Jr.

 

minha gente era triste, amargurada

inventou a batucada pra deixar de padecer

salve o prazer, salve o prazer

 

 

vestiu uma camisa listrada e saiu por aí

em vez de tomar chá com torrada

ele tomou parati

levava um canivete escondido

e um pandeiro na mão

e sorria quando o povo dizia

sossega, leão – sossega, leão  

                                                                            Assis Valente

   

     meu chapéu de lado

     tamanco arrastando

     lenço no pescoço

     navalha no bolso

     eu passo gingando

     provoco desafio

     eu tenho orgulho de ser vadio

                                 Wilson Batista

    ...

       

    que tempo mais vagabundo esse agora

    que escolheram pra gente viver

                                      Titãs

   

 

Talvez o urbanismo já tenha resolvido o problema, mas em 1935 no Rio o lugar ocupado por cada um na hierarquia social media-se com o altímetro: quanto mais baixo mais alto estava o domicílio. Os miseráveis viviam pendurados na desolação, nas favelas, onde uma população de negros vestidos com farrapos bem deslavados inventava com o violão essas melodias vivazes que, em época de carnaval, desciam das alturas e invadiam a cidade com eles.

 

         ...

 

E como esses casebres estão situados no alto dos morros, nos mais inacessíveis recantos, têm a mais bela vista que se pode imaginar, a mesma vista que têm as mais caras vilas de luxo, e é a mesma natureza luxuriante que orna seus lotezinhos com palmeiras, e generosamente lhes dá bananeiras, essa maravilhosa natureza do Rio, etc.

 

Algumas coisas que talvez

              amanhã tenham desaparecido

 

     Com essas favelas desaparecerá uma parte interessante, um pedaço incomparável do Rio, e quase não posso imaginar os morros da Gávea (olha a Rocinha nascendo aí, gente!) e outros sem esses pobres casebres, colados na rocha, que com o seu primitivismo lembram quanto de supérfluo temos e exigimos.

Também outra originalidade do Rio em breve será vítima da ambição civilizadora... etc.

 

  Algumas coisas que talvez

                amanhã tenham desaparecido

 

  do zinco à alvenaria; da malandragem à safadeza  

              ÓPERA DO MALANDRO

& à fuzilaria das cidadelas do “crime organizado”.

Rio, 5, 565... mil vezes favela

 

    JOBINIANA:

    ERA UMA VEZ UMA CIDADE  

      

Tantas e tamanhas foram as novidades entre os anos 1950 e 1970 que não houve nem tempo para nostalgia. Além de que o mundo antes passara pela maior depressão econômica e pelas tais duas maiores guerras da história. O que dá até para se pensar: nostalgia por um tempo desses?!

 No início dos anos 70 nada maravilhava,  surpreendia ou chocava tanto como nos anteriores, até porque cabeças, olhos e ouvidos já se tinham acostumado a tudo. E porque os anos precedentes foram marcados por The Beatles e o free jazz, Godard e Truffaut, Mary Quant, os hippies, Maio de 68, as guerras dos Seis Dias, do Biafra e do Vietnam e a primeira pisada (de elefante) do homem na lua. Além da primeira séria ameaça de hecatombe nuclear.

 Só no início dos anos 1990, com o advento do CD e a digitalização do repertório audiovisual das décadas anteriores, é que se viveria uma onda de revivalismo tão grande quanto – em verdade, muito maior que – a daqueles anos. Quando Edu Lobo planejava compor uma peça musical sobre a Era Vargas a partir da história do rádio.

 O plano, pelo próprio enunciado sem maiores detalhes, partindo de quem partia (Edu, filho do pernambucano Fernando Lobo, autor de Chuvas de Verão) e relacionando-se ao personagem em questão,  fazia pressupor uma retrospectiva crítica de uma outra ditadura que redundaria em crítica à ditadura militar, então no auge da dureza, e redundou em Seu Getúlio, parceria com Chico Buarque. Que poucos anos depois lançou Ópera do Malandro, um exercício que partia das mesmas premissas: o malandro ontem e hoje na história do Rio. Da malandragem, com uma certa aura até mesmo romântica, à safadeza institucionalizada.

 

 Agora, já não é o normal o que dá de malandro regular, profissional , malandro com aparato de malandro federal, que nunca se dá mal.

 Mas o malandro pra valer não espalha, aposentou a navalha, tem mulher e filho e casa e tal.

 Dizem as más línguas que ele até trabalha, mora lá longe,  chacoalha no trem da Central.

 

 Do barraco de madeira e telhado de zinco ao de eternit e alvenaria, de cinco a 565 favelas, tudo muda de figura.

 Em Cidade Partida Zuenir Ventura conta tim-tim por tim-tim todo o processo que da ditadura Vargas à ditadura militar leva também a polícia a mudar assustadoramente de cara, da caixinha com que brasileiro sempre conseguiu dar um jeito à corrupção e concussão mais deslavada e aos esquadrões da morte.

 Uma estória que talvez tenha começado com o empastelamento de Cara de Cavalo, quiçá a primeira notícia em que a opinião pública carioca teve a impressão de execução de um marginal por parte dos homens da lei – sanguinolência escarrapachada nas primeiras páginas dos jornais que parecia pior que em filme de Sam Peckimpah – e que fez pensar em quem era o quê na situação.

     Nos morros implantaram-se as praças fortes do crime organizado que de organizado não tem nada, até porque não precisa pelo estado de prontidão (no velho mau sentido do tempo de Noel) das malditas forças de insegurança, essas sim talvez a tal da facção criminosa.

     Essa “evolução” é narrada de várias perspectivas pela música popular. A da polícia bandida vastamente documentada na obra do rei do sambandido Tárik de Souza) Bezerra da Silva e do próprio Chico Buarque, através da dupla fictícia Julinho da Adelaide-Leonel Paiva, em Acorda Amor ou Chame o Ladrão (porque os home estão chegando).

     Outro exemplo: Negra Melodia Luís Melodia, do morro do Estácio, tem um amiguinho em cana. O Charles Anjo 45 de Jorge Ben(jor). Do tipo dos últimos marginais românticos, posteriores ao de navalha no bolso, já com o trêsoitão, que se for o caso matam por instinto de sobrevivência, deformação de caráter, má educação ou psicopatia mesmo. Como Mineirinho. Ou Cara de Cavalo, que se aventura a pisar nos calos da Scuderia Le Cocq entrando no ramo da proteção a bancas do bicho e de teimoso é executado. De Mineirinho a Chico Buarque a coisa muda tanto de figura que Lúcio Flávio é obrigado a dizer a um agente: Polícia é polícia, bandido é bandido. Como em Chama o Ladrão, já não se sabe quem é o quê.

     Bandidos como esses vão parar na Ilha Grande, onde aprendem rudimentos de organização de base clandestina com os presos políticos que ali encontram. Nasce o Comando Vermelho. A coisa fica preta. As favelas começam a parecer casas fortes medievais com sentido oposto. Os mouros não são eles. São os moradores do asfalto.

     Os tiroteios que Moreira da Silva, o Kid Morengueira, reportava no seriado de cine-sambas-de-breque na década de 1950 remetiam a filmes de bangue-bangue de caubóis e índios. Não tinham nada a ver com noticiário local sobre tiroteio e vítimas de bala perdida que encontra um corpo sólido e vivo saindo de casa.

      Surgem as boates e lá se vai o tempo de cassinos e gafieiras. Um tempo que vem dos chopes dançantes e do Kananga do Japão para desembocar na Elite e na Estudantina, ainda subsistentes, o seu samba de gafieira e os rígidos códigos de conduta, ou estatutos, dos frequentadores.

      Um tempo em que estatuto e boa conduta ainda eram sinal de pedigree. Em qualquer circunstância. Na gafieira como na malandragem que ainda era possível cultivar.

     Tempo da dita boemia da Lapa, derrubada com a construção do túnel de metrô. E do Largo do Estácio, nas imediações da antiga Praça Onze. Que como berço do samba era muito frequentado mesmo por gente que não era do morro de São Carlos ou da pura e simples vadiagem.

                     

                Meu velho, pobre velho

                vem subindo a ladeira

                com uma bengala na mão

                É o Estácio, velho Estácio

                Vem visitar a Mangueira

                e trazer recordação

                Professor chegaste a tempo

                pra dizer neste momento

                como devemos vencer -    Cartola

 

A fotografia de uma etapa da transição de uma(S) coisa(S) para outra(S) talvez esteja nesse flash de jornal:

     Eu sou apenas poeta e compositor: meu negócio é samba, dinheiro, bebida e mulher.

     A declaração é de Luís Mário Alves, 32 anos, o Luisão, que está sendo apontado pela polícia como um dos matadores da Baixada Fluminense e o homem que, junto dom Fernando Antunes, o Arroz, controla a maior parte das bocas-de-fumo da região.

     Depois que meu retrato saiu no jornal não consigo mais dormir nem trabalhar direito; nem sequer estou com inspiração para compor meus sambas de embalo; tenho vários já feitos e cantados pelo pessoal daqui de baixo; um deles, sempre muito cantado por aqui, é O Couro Comeu que fala em muito bandido e muita malandragem.

     Moço, já falei, minha malandragem é no samba; tenho cinco mulheres e vivo bem com todas elas, me garanto mesmo.

     O Globo, Rio de Janeiro, 18 de agosto de 1977

 

     A história necessariamente incompleta de Renô Partideiro, um quase Charles Anjo 45 ou ele mesmo - o amigo de Luís Melodia, cria do Estácio -, foi revelada com sentimento e balanço preciso três anos antes no número 3 do jornal Versus, de São Paulo, através de uma reportagem de Moacir Oliveira Filho em duas das mais belas páginas do jornalismo ilustradas por Jaime Leão. Extratos do relato:

      Quem matou este Orfeu?

     A morte de Renô, no carnaval de 74, vai repetir a história inventada por Vinícius de Moraes.

Era um grande sambista. Era um ex-presidiário. Sua história ficou no folclores das vidas de Estácio de Sá.

Vou ouvindo alguém dizer que ele nasceu no morro de São Carlos. Cedo aprendeu a arte do partido alto. Uma arte construída com inspiração e rapidez. Bambas se desafiando em versos. Uma coisa meio fatalista: desafio é pra homem e macho não foge. Aprendeu as coisas com o pai Oto Branco, um dos maiores partideiros do Rio. Não fuja nunca, lhe disse o pai. Alguém me diz: levou a lição do partido alto sério demais, por isso teve tantos dramas pela vida.

Renô é um James Dean do morro, rimas na cabeça, faquinha na cintura. Brigas com a polícia. Lutas de gangs. Muitas coisas aprendeu Renô com seu pai. Ele enfrentava dez malandros no tapa ou na pernada. Mas não gostava de revólver. Os James Dean dos Morros andam armados.

Do Estácio muito se fala, pouco se conhece. Peço a um amigo: me fala um pouco do Estácio.

Apesar de ser um lugar meio mal visto o Estácio é o centro da boemia do Rio depois que a Lapa acabou. Ali a vida não para. De segunda a segunda a gente tem onde ir. As coisas acontecem com tanta intensidade que se você quiser acompanhar tudo não tem tempo nem para dormir. Lá estão os melhores partideiros da cidade. O Estácio ficou conhecido como Academia do Samba. E até 59 a Mangueira famosa, reconhecendo isto, fazia um desfile especial no Estácio para homenagear este lugar tão querido... No lugar, sabe, as pessoas esquecem até do trabalho...

Vejam só. Dez anos de Renô longe do Estácio. Longe do samba ele não fica. Os presídios tem destas coisas. O sujeito fica longe da vida, que só espia da escuridão da cela, mas pode fazer samba.

Lá no presídio do Rio, de onde se vê um pedaço de morro, Renô vai levar alguns amiguinhos para seus companheirinhos verem: é o Macalé, é a Gal, é o Gilberto Gil. Macalé era amigo e parceirinho. Quase conseguiu mostrar ao povo que existia um tal Renô Partideiro, músico da pesada. Renô azarado.

Sobre vidros e cascalhos

sobre espinhos e vergalhos

ou levando a vida assim

tem montanhas e obstáculos

tem pedreiras

eu não derrapo

mas tenho mesmo que seguir.

Não piso com força o piso

piso sempre devagar

por mais que eu me esquivo

no precipício posso acabar

será preciso cuidado

para eu continuar.

Os jornais da época narram assim sua morte: "Ao mesmo tempo em que Rúbia (19 anos) e Rose (25 anos) inocentam o Pm, acusam alguns integrantes da Bateria da Escola de Samba Unidos de São carlos de terem assassinado o compositor Renaut cardozo, irmão de ambas, cujo corpo foi encontrado ainda com vida na Rua méxico, nas proximidades do consulado dos Estados Unidos. A vítima teria tido um desentendimento com membros da Escola e por isso trocou socos e pontapés com alguns integrantes da bateria encontrando em consequência a morte." (O Dia - 2 de março 74)

Na verdade não se sabe como e nem porque Renô foi assassinado. Até hoje poucos sabem da vida e morte de Renô Partideiro que naquele dia vestia um terno branco e caminhava pelas ruas distribuindo rosas amarelas. 

 

     O que nos remete a uma outra perspectiva a partir da Leniza de Marques Rebello.

      Carmen Miranda/Leniza, de balconista, através de Josué de Barros, irá transformar-se na maior estrela brasileira da história. Portuguesa pequenina mas com ego e carisma mais altos que os sapatos plataforma que se tornaram parte da imagem de marca da falsa baiana. Aconselha-se com Getúlio e diz-se que é o Velho que a induz a garantir por contrato que o Bando da Lua a acompanhe nos States. Cria uma task force para a campanha me disseram que eu voltei americanizada, que produz sete músicas. Espampanante, um tanto destrambelhada às vezes e folgazã sim. Vivaz e espirituosa, na vida privada como nos palcos e no set. Mas bastante ponderada e consciente dos seus papéis quando se trata de tomar decisões sobre o que fazer sobre eles.

 Toma Brasil Pandeiro como uma indelicadeza para com os americanos e se recusa a gravar o samba, o que lhe custa a amizade com Assis Valente, que lhe cedera alguns dos seus maiores sucessos. Sente-se toda e só brasileira e sente absoluta necessidade de afirmar a sua brasilidade a toda hora. Mesmo que no fundo isso pouco importe, porque a capital do Brasil era Buenos Aires.

      Carmen Miranda/Leniza é um dos símbolos – senão o maior – da dita época de ouro, a da fixação dos estilos urbanos e de vocalização, orquestração e temática das canções. Funda-se ali também, através de uma indústria “cultural” e de entretenimento que se consolida a partir do rádio, a vida de artista, que para o senso comum ainda se caracteriza sobretudo pela permissividade sexual e vadiagem, ou malandragem.

 

 Estatuto/status de artista. Status e reputação eram, pelo que se depreende, motivo de preocupação de Noel Rosa, o ex-estudante de medicina branco de classe média que foi um dos primeiros a pretender fazer carreira como sambista. Quando Wilson Batista – de quem Mário Lago dizia nos últimos anos de vida não falar sobre marginais – sai-se com Lenço no Pescoço Noel fica pior que uma arara e em tom seco, bastante irônico mas que não esconde a acidez despoleta a primeira grande polêmica da história da música popular brasileira. Nela Noel atua com tal destreza que em Frankstenstein da Vila, um dos sambas-resposta, a contraparte chega a perder a compostura.

 A polêmica produziu no mínimo duas obras-primas de Noel: Rapaz Folgado e Feitiço da Vila.

       

      deixa de arrastar o teu tamanco

      pois tamanco nunca foi sandália

      tira do pescoço o lenço branco

      joga fora a navalha que te atrapalha

                (...)

      proponho ao povo civilizado

      não te chamar de malandro

      e sim de rapaz folgado

       A favela romântica da visão de Stefan Zweig é a da imagem que dela se terá por mais duas décadas, passando por Orfeu da Conceição de Tom Jobim e Vinícius de Moraes e o filme Orfeu Novo e pelo samba Barracão, da dupla Luís Antônio-Oldemar Magalhães – um dos pontos altos da histórica gravação ao vivo de Elizeth Cardoso com Jacob do Bandolim e Época de Ouro: barracão de zinco, tradição do meu país... Ainda motivo de orgulho (por quê?).

     Virou alvenaria que mal dá para embolsar e caiar.

     Visões de longe, como a de Chão de Estrelas de Orestes Barbosa, com a lua a furar o telhado de zinco. Ou até mesmo visões de dentro, como a de Alvorada de Cartola: alvorada lá no morro, que beleza...

 Em Sinfonia do Rio de Janeiro, de dois lídimos representantes da fina flor da Zona Sul, a abordagem da favela já pinta um clima de lamento pela perda de um certo tipo de “tradição” e por no asfalto não se dar o devido valor ao seu melhor produto – O SAMBA, esplendor escondido por trás da pobreza. Em que já se entrevê um não sei quê de acender a vela e o morro não tem vez de Zé Ketti no show Opinião, dez anos depois, tempo em que já se retrata os dramas de 5 X Favela e Sérgio Ricardo canta no fogo de um barracão só se cozinha ilusão, restos que a feira deixou...

                 

       

      Rio, capital federal, apesar de entre as duas maiores guerras da história da humanidade, tempo de muito formalismo mas também de brejeirice e ingenuidade.

        O Rio amanheceu cantando

        toda cidade amanheceu em flor

        os namorados vão pra rua em bando

        porque a primavera é a estação do amor

 

            Todos tinham gostado dela no estúdio. Ficara um pouco nervosa no princípio, era natural, mas Julinho animara-a, venceu o nervosismo e se saíra perfeitamente. Cantara com naturalidade, em meia voz, bem junto ao microfone. O crítico Arlindo se chegou para ela depois: - Quem te ensinou a cantar assim? - Assim como? – Assim, baixo, juntinho ao microfone... – Ninguém. Por quê? – Porque é assim mesmo que se canta, minha filha. Você tem instinto!... Na saída, animada, criara coragem e abordara o Porto a respeito dos cobres. Ele confirmara o que tinha dito: três vezes por semana no programa Cidade Encantada, cachê de quarenta. Mas receberia tudo no fim do mês para facilitar, o que equivale a um ordenado. Não ficava mesmo melhor? Ela achava que sim. Bolada é melhor. Dinheiro aos pinguinhos é o diabo. Escorrega como sabão. Quando a gente dá por ele, está a néris.

 

  A mais de meio século de distância é interessante ver como em cantoras com esse ou aquele timbre ou impostação, ou graduação etílico-existencial, o repertório de um Adelino Moreira vai além do passável e chega a parecer sublime - como nos casos de Simone em Matriz e Filial e Ângela Ro Ro em Fica Comigo Esta Noite - ao mesmo tempo em que seria impensável qualquer tipo de abordagem por outras – como talvez Nana Caymmi, que muito compreensivelmente o recusa por princípio enquanto se aventura a cantar com o extremo rigor e a (com)postura de sempre outro tipo de samba-canção e até boleros.    

       Breguice é de resto elemento indissociável da maior parte da humanidade atolada na cultura de massas, do dito Primeiro ao c... do Mundo. O termo cafona aportou no Brasil com os oriundos dos portos de Nápoles e Gênova.

   Seja como for, como escreveu Caetano Veloso, Anísio Silva, Adelino Moreira e o que possa haver de mais brega, kitsch ou o que seja nessa como em outras matérias subculturais é indissociável de aspectos caracteriais básicos da sociedade brasileira e das condições de vida do seu povo. Deste ao menos é aliás espelho fiel.

       Que moleza. Boleros e balidos. Havemos de morrer todos como carneiros calados? – perguntou-se Caetano em Alegria, Alegria, seu livro de crônicas organizado por Waly Sailormoon (Salomão), num texto em que associa um certo Roberto Carlos das primeiras fornadas com Anísio Silva. Foi o que o novo baiano quis dizer de forma clara através da Tropicália e de colagens de guitarras elétricas, música antiga e dodecafônica com Teixeirinha. Que o país tropical do futuro era muito verde-claro-amarelo-ovo-rosa-choque-e-azul-bebê ou outra mistela do gênero. E desafortunadamente, pelo que isso revela de facetas retrógradas ou inércia, talvez o seja hoje muito mais que então. (Eternit, alvenaria, móveis das casas bahia...)

       No final dos anos 1950, com o advento da bossa nova em plena era JK – em que até segundo os entendidos o Brasil pareceu ser mesmo o país do futuro -, finalmente Elis passou a ter o que ouvir em casa e o Rio, já se preparando para deixar de ser a capital, parecia ter abraçado tudo o que haveria de melhor na modernidade. Era uma vez uma cidade. Que não seria mais a da dor-de-cotovelo e da histeria na Rádio Nacional, mas mais sofisticada, suave e sutil. Jobiniana.  

 

Algumas coisas que talvez

             amanhã tenham desaparecido

 

Não foi nada disso que Zweig pensou.

Abre-se a cortina do passado e o cenário queimou.

       A aquarela é desbotada e coalhada de sangue e a alvorada mal despontou.

       Quando Ari Barroso ainda a retocava com berloques & brocados parnasianos o francês já postulava: decaiu antes de se erguer. O mulato inzoneiro esbanguelou-se e  entre os escombros da mata brotou um quase continente favelado.

Que desperdício de mata e de gente.

Que desperdício de canções.

       Descerrando a cortina do passado vê-se a pobreza miserável descambar em miséria endêmica e os sonhos de grandeza atolarem no jabaculê do sacolão do faustão. A matéria-prima hoje é funk, é punk, é lixo, é baixaria.

       Não se sabe se funk ou rap é tema de música popular ou só caso de polícia.

O sofisticado edifício harmônico erigido no bas-fond da Copacabana  modernista entre Ravel e Thelonious Monk redundou na rude arquitetura de palafita sobre a lama do Miami bass.

    O que desapareceu, como diz o título do documentário de Walter Salles Jr. sobre Chico Buarque, foi o Rio da delicadeza. Ou como disse o auto-exilado (por força das circunstâncias do regime do jabá ou jabaculê) Dori Caymmi: Fico aqui em Los Angeles sonhando com um Brasil cheiroso que não existe mais.  

        Do lenço no pescoço e a navalha no bolso

ao capuz e fuzil Uzi

da floresta à favelização

da vagabundagem e do jeitinho à safadeza

foi um passo de gigante para a barbárie

medieval que o Brasil não teve. Desde a

guerra de Canudos, quando os suseranos

fizeram terra queimada de uma suposta

rebelião de Robin Hoods da fé, o Brasil

parece regredir ao invés de avançar

para a Renascença.

 

       

      Dona Antônia estava na porta, enxugou as mãos no avental, investiu com espalhafato:

   - Ora viva! Dá cá um abraço!

   - Muito agradecida, dona Antônia. (Dona Antônia cheirava a sabão, a cebola, a óleo de babosa, a suor. Dona Antônia sabia. Logo, toda a rua sabia, todo o bairro sabia. Era a gazeta da zona.)

   - Seiscentos bagarotes, me disseram. Que mina, hein?... Não queres saber de outra vida, não é? (E pensava: Está aí, está na vida.)

       Mas Leniza pediu desculpas, ia entrar, estava muito cansada do ensaio (Dona Antônia comentava o tal “cansaço do ensaio” ao seu modo: Que vergonha! Também nunca se enganara com ela... Era só ver aquela cara...) Depois, com calma, viria contar tudo. Era o que dona Antônia pedia, exigia: Tudo! Queria saber tudo! Diziam que este negócio de rádio, lá dentro, era uma pouca vergonha, uma grossa bandalheira. Nunca acreditara, nunca! Só acreditava no que via. Levantava piedosamente os olhos para o céu: Deus é testemunha. Agora tinha a prova. Ela, que era uma menina direita (carregava no “direita”) não iria se meter lá dentro se fosse como diziam.

   - Falam muito, dona Antônia (Que bandida! Era de escarrar na cara!)

 

       Quando o Carnaval Chegar (1972), de Cacá Diegues, com Nara Leão, Maria Bethânia e Chico Buarque, é como que uma réplica moderna das antigas chanchadas da produtora Atlântida filtradas pelas lentes do cinema novo, e por esse prisma talvez mais interessante que a grande maioria delas. É no mínimo uma bela coleção de cineclipes da sua trilha sonora, em que além das músicas de Chico contém um grande sucesso de João de Barro e Alberto Ribeiro que traduz o espírito ingênuo e jovial que, beneficiados pela filtragem de mais de meio século e sem fazer um close na   cama de jornal da personagem de Noel, podemos sentir de forma ainda muito vibrante perpassando pela quase totalidade do volumoso repertório de jóias raríssimas da Época de Ouro e da Era do Rádio no Rio de Janeiro.  

 

            nós somos os cantores do rádio

            levamos a vida a cantar

            de noite embalamos teus sonhos

            de manhã nós vamos te acordar

 

            nós somos os cantores do rádio

            nossas canções cruzando o espaço azul

            vão reunir num grande abraço

            corações de norte a sul

 

 

 

 

 

 

                                                                          FIM

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

          MÚSICA DO BRASIL DE CABO A RABO

             veja e leia também em revoluciomnibus.com

 

 Música  do Brasil de Cabo a Rabo é um livro com a súmula de 40 anos de estudos de James Anhanguera no Brasil e na América do Sul, Europa e África. Mas é também um projeto multimídia baseado na montagem de um banco de dados com links para múltiplos domínios com o melhor conteúdo sobre o tema e bossas mais novas e afins. Aguarde. E de quebra informe-se sobre o conteúdo e leia trechos do livro Música do Brasil de Cabo a Rabo, compilado a partir do banco de dados de James Anhanguera.

         

          CORAÇÕES FUTURISTAS nunc et semper  AQUI   

 

   Você já deve ter visto, lido ou ouvido falar de muita história da música brasileira da capo  a coda, mas nunca viu, leu ou ouviu falar de uma como esta

  Música  do Brasil de Cabo a Rabo

   Todas as histórias limitam-se à matéria e ao universo musical estrito em que se originam, quando se sabe que música se origina e fala de tudo.

   Por que não falar de tudo o que a influencia e de que ela fala sobretudo quando a música popular brasileira tem sido quase sempre um dos melhores veículos de informação no Brasil? Sem se limitar a dicas sobre formas musicais, biografia dos criadores  e títulos de maior destaque. Revolvendo todo o terreno em que germinou, o seu mundo e o mundo do seu tempo, a cada tempo, como fenômeno que ultrapassa - e como - o fato musical em si. 

  Destacando sua moldura

       dessa janela sozinho olhar a cidade me acalma

       dando-lhe enquadramento

       estrela vulgar a vagar, rio e também posso chorar...

       histórico, social, cultural e pessoal. 

Esta é também a história de um aprendizado e vivência pessoal.

    De um trabalho que começou há quatro décadas por mera paixão infanto-juvenil, tornou-se matéria de estudo e reflexão quando no exterior, qual Gonçalves Dias, o assunto era um meio de estar perto e conhecer melhor a própria terra distante e por isso até mais atraente. E que como começou continuou focado em cada detalhe por paixão.                    

Música  do Brasil de Cabo a Rabo

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          em negrito capítulos ou seções de capítulos com trechos acessíveis a partir de seus títulos

             

O LIVRO DA SELVA 

Productos Tropicaes   e   Abertura em Tom Menor

        1.    O BRASIL COLONIZADO

                raízes & influências Colônia e Império  

               1. A  Um Índio    1. B  Pai Grande  1. C  Um Fado  

        2.     TUPY E NOT TUPY 

formação de ritmos e estilos urbanos suburbanos e rurais   

Rio sec. 19-sec. 20 - Das senzalas às escolas de samba

        3.     Os Cantores Do Rádio    

                      a ESTreLa SoBE

            CARMEN MIRANDA DE CABO A RABO

                                                     fenômeno da cultura de massa do século XX

                        

        4.     BOSSA NOVA do Brasil ao mundo      

                Tom Jobim   INÚTIL PAISAGEM  

                    de Rumo à Estação Oriente 

      5.  BOSSA MAIS NOVA o Brasil no mundo

 

O LIVRO DE PEDRA

        PARA LENNON & McCARTNEY           

        VIDA DE ARTISTA crise e preconceito = inguinorãça

        CENSURA: não tem discussão. Não            

        POE SIA E MÚSICA POPULAR BRASILEIRA

        O SOM É MINAS: OS MIL TONS DO PLANETA        

        MARIA TRÊS FILHOS

        (SEMPRE) NOVOS BAIANOS         

        NORDESTONTEM NORDESTHOJE

       RIO &TAMBÉM POSSO CHORAR       

       FILHOS DE HEITOR VILLA-LOBOS

INSTRUMENTISTAS & INSTRUMENTAL

              Sax Terror      

       SAMBA(S)

       BLEQUE RIO UM OUTRO SAMBA DE BREQUE        

       FEMININA

       MULHERES & HOMENS NO EXÍLIO

             o bêbado exilado & a liberdade equilibrista

       ANGOLA          

       ROCK MADE IN BRAZIL

             ou Quando a rapeize solta a franga

       LIRA PAULISTANA            

       CULTURA DA BROA DE MILHO

       LAMBADA  BREGANEJO AXÉ  E  SAMBAGODE

       RIO FUNK HIP SAMPA HOP

             E DÁ-LE MANGUE BITE RAPEMBOLADA

       DRUM’N’BOWSSA            

       CHORO SEMPRE CHORO     

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