revoluciomnibus.com  James Anhanguera ERa Uma Vez A RevolUÇÃo  ...IV ERa Uma Vez A RevoluÇÃO aos pÉs da cruz

       É convocada uma RGT para decidir o que fazer sobre a questão e logo no início, sob a égide de um Cristo crucificado que ainda está ao alto da parede de fundo da sala de reuniões, alguém propõe a suspensão de seis dos oito noticiaristas da casa. Estão de fora apenas o ‘repórter nacional’ e o chefe, que procura manter-se o mais neutro possível em relação a todas as questões (ainda não se sabe muito bem porquê). Numa prodigiosa tentativa de inversão do quadro negro que se apresenta, revelando toda a argúcia de quem na militância clandestina foi habituado a pensar todos os termos de enfrentamento dos factos com frieza pragmática, a um dado ponto da acalorada discussão, quando um dos supostos preservacionistas dos interesses da rádio e dos funcionários brada que não há como não afastar temporariamente aqueles que poderiam a partir de uma mera informação acabar com o único meio de subsistência de dezenas de famílias, por tratar-se antes de tudo de gente irresponsável que não merece a mínima consideração, Rui Paulo da Cruz, que às vezes mal consegue falar ao microfone com dores num dedo mindinho aleijado em sessão de tortura, toma a palavra para recordar:

       - Mas, camaradas, Jesus perdoou Maria Madalena!

       De nada lhe vale o apelo aos bons sentimentos cristãos. É suspenso, juntamente com os outros cinco, até que futura RGT decida o que fazer com os ‘radicais’.

       António Castro, meio anarcóide, Ed jovem muito irado e rebelde, um e outro são apenas mais duas vozes no coro que decretou a chamada ocupação da rádio – e que de ocupação premeditada não teve nada – e pugnam apenas pela liberdade de expressão, cuja luta já custou caro a um e poderia ter custado caríssimo a outro. A ideologia de Ed, por indefinição e talvez por defeito, é a da paz, igualdade entre todos e liberdade – sem limites? Não... Comunista no sentido marxista-leninista, trotskista ou maoista não é. Anarquista também não. Por estranha – mas compreensível, por desinformação da idade e a formação católica até ao início da adolescência – associação imagística, preto é cor de luto, morte, tristeza, destruição pura e simples. Não teve nem tempo de pensar nisso; em última análise, anarquia para ele é o que passou a significar na acepção mais vulgar.

       Nem anarca nem hippie. Abolir o Estado? Como? Abro Campus, da colecção J’Ai Lu, da Stock-Paris, com trechos de emissões de Michel Lancelot, e releio diálogo de Leo Ferré e Claude Nougaro:

       - Ce sont les régimes qu’il faut foutre en l’air! Il faut touer chaque jour un chef d’État. Pendant six semaines. Pendant six mois – proclama Ferré.

       - Mais, objecta Nougaro, dis-moi pourquoi? Ils vont être remplacés par la même graine.

       Regresso à comunidade tribal? Nem por sombras, nem Rousseau acreditava nisso.

 25 antes durante depois ...............

          revoluciomnibus.com    IV Era uma vez a revolução 15           James Anhanguera

               ir para PORTAL de acesso a outros trechos e a Índice Remissivo de