Diz-se já à boca pequena que os ‘reaccionários’ que não cometeram crimes contra os direitos humanos terão direito a uma segunda oportunidade através de uma reciclagem político-ideológica – mas nunca, é claro, em cargos de responsabilidade e confiança.

            Almoço com António Castro num snack ao fundo da Rua do Carmo. Falamos da rádio e do que poderia ser do ponto de vista dos dois. Tirar-se-ia do ar ao menos cinco programas, o que quereria dizer sete horas de emissão diária de produções externas e boa parte da base de sustentação da emissora. Após anos de transmissão finalmente a rádionovela Simplesmente Maria – um dos maiores fenómenos de massa portugueses na ‘primavera marcelista’, que ressuscitou um género de que já se esquecera, os chamados ‘folhetins do Tide’ - está a um mês do fim. É com expressão de prazer, profundo gozo mesmo, os olhos rasos quais os de uma criança, que estampa quando a sua faceta a modos de dizer mais anarca prevalece sobre as outras, que António lança a ideia de propormos à RGT a suspensão da transmissão do programa. Coisa de velho anarca doido, que teria quase o mesmo efeito da explosão de uma bomba numa estação de metro às oito e meia da manhã, mas que se levada adiante com galhardia e habilidade poderia até ser aprovada nestes dias de mudanças tão radicais. Paradoxalmente é o mais jovem dos dois que após o entusiasmo do primeiro instante lança água na fervura, alegando que dificilmente do porteiro e assistente dos telefones aos escriturários e produtores externos a maioria da assembleia iria aprovar uma moção do género, que empurraria grande parte da audiência, as donas de casa, para a frequência popularucha dos Emissores Associados de Lisboa e do Rádio Clube Português, que em Onda Média têm o mesmo perfil da antiga emissora católica portuguesa, mas que de Simplesmente Maria só tiveram quando muito uns agora mais que decadentes Parodiantes de Lisboa.