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Desde o início ninguém se entende. A lua de mel entre todas as forças e frentes dura exactamente uma semana, até ao 1o de Maio, o tempo de comemorar o reviralho. Súbito, corrida de obstáculos pela melhor imagem pública – e Soares sai à frente a anunciar digressão ao norte da Europa para angariar junto aos amigos sociais-democratas, no poder ou perto disso, apoio à restauração da democracia no país – e nos bastidores todos já a engalfinhar-se sem que se saiba muito bem o que se passa. Sobrepõe-se a todas a vox populi que exige que Thomaz e Caetano sejam mandados para o Campo Pequeno – e todos os políticos e empresários que sustentavam ou se apoiavam no regime a reboque. O pretenso Estádio Nacional de Santiago do Chile da ‘esquerda’ em Portugal é o próprio templo da tradição marialva-ó-salazarista - quanto simbolismo.
Uma mão lava a outra, destaco-me para cobrir a chegada do voo com os exilados de Argel, com destaque para A VOZ da Rádio Portugal Livre, Manuel Alegre. A caminho, na Rua D. Estefânia vejo uma faixa em cima da porta de uma oficina mecânica a anunciar
‘Ganda história’. Entro em directo às 16 e 20, chamado por António Castro, que ainda lê notícias, a relatar os motivos de uma greve numa oficinazeca, o que só se justifica por ser algo que até há tão pouco tempo não se podia anunciar assim em faixas e menos ainda noticiar, ou vice-versa. Quatro horas depois estou pela primeira vez no ar no Página 1, que encerro com uma reportagem especial de 20 minutos sobre a chegada do avião de Argel centrada em Manuel Alegre, com erreémes e os seus poemas musicados e cantados por Adriano Correia de Oliveira, e Alegre que se fizera triste, já forte candidato a ‘animal político’, com todo o tento deste mundo no timbre vocal e no entusiasmo. Formada por representantes de todos os departamentos da pequena casa – administrativos, técnicos, auxiliares do telefone e da limpeza, jornalistas, locutores e produtores -, a comissão de gestão da RR negoceia acordo com o Patriarcado e o Episcopado de Lisboa para desmembrá-la do grupo – que se revelou ter, entre outros imóveis, uma data de cinemas e estúdios espalhados pela cidade. Vou à outra banda no carro de reportagem com Rui Paulo da Cruz à cata de notícia sobre uma RGT nos Estaleiros da Lisnave e tomamos conhecimento de que ali a dois passos estão a prender pides. O prédio em que entramos compõe um enorme quadrado de cimento que ocupa um quarteirão e no interior há como que uma praça de armas comum, transformada num imenso Coliseu em cujas altíssimas paredes ecoam arrepiantes gritos de populares em impiedosa caçada a UM pide. Nada mais compreensível, embora aterrador. |
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