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França longe de Maio de 68 Em Paris ou Marselha, Agosto de 1976, é quase impossível olhar para qualquer lado sem se ver uma carrinha Citroën da polícia com meia dúzia de flics, sirene e pisca-pisca de alarme abertos e movimentando-se a alta velocidade. Às sete horas da manhã nas imediações da Opera, às seis da tarde na zona do Pigalle, madrugada alta na rua mais noctívaga da capital, Mouffetard, ou na do trottoir da antiga Marcília romana, Rue de Rôme e adjacências, o tradicional realejo em três por quatro dá lugar ao ni-no-ni, ni-no-ni, ni-no-ni-no desritmado e lá vão eles recolher indivíduos ou grupos capturados em rusgas realizadas por polícias à paisana que se deslocam em carros de passeio, provocando a mesma reacção em quem passa: um olhar automático e inexpressivo. ‘Sabemos que a opinião pública tem um humor tão repressivo quanto o dos ministros de Estado’, comenta Le Quotidien de Paris num destes dias do Verão mais quente desde os tempos de Maupassant. Em França, que apesar da subida imparável do deutschemark ainda é capital da velha e cansada Europa do Mercado Comum e do cimento armado, é muito natural que o intermitente apito agudo das sirenes seja apenas um ruído constante e mais ou menos distante na banda sonora da massa humana que melhor reflecte no seu sistema de vida e comportamento em sociedade a paranóia dos sistemas de ‘segurança’ e ‘estabilidade’ social. Uma paranóia que passa pelo mais abjecto segregacionismo racial e económico e se reflecte nas paredes e muros das cidades que ainda há oito anos mostravam pichações do tipo sejamos realistas, exijamos o impossível e hoje exibem a consciência do medo e da morte: turco assassino; proibido a cães, negros e palestinianos; Israel; a Europa Vencerá, etc. Como nos policiais de Hollywood em Saint-Dennis um polícia grita ‘renda-se ou atiro’ e atira a matar um jovem de 17 anos que fugia com três camaradas, em cena que se repete diariamente perante as câmaras insensíveis da opinião pública que de nada se compadece para não abrir mão do maço de Gitanes, do copo de Ricard e do comando à distância do receptor dos quatro canais da TV oficial. Um português de 21 anos acusado de um assalto importante levou choques eléctricos nos testículos durante o interrogatório, segundo denúncia do Rouge, jornal da trotskista Liga Comunista Revolucionária. Uma onda de assaltos e ‘vandalismo’ nas estações de metro alarma a população e é montada uma enorme rede de caça a marginais dirigida sobretudo contra negros e árabes. Uma bomba explode pouco depois de uma visita do ministro do Interior, Michel Poniatowski, a uma estação para comprovar as condições de segurança nos túneis, onde no meio da confusão agentes da polícia e da brigada de segurança da RATP acabam por protagonizar cenas de tiroteio em que se matam uns aos outros. A polícia matou um jovem na Porte de Glignancourt e Leo Ferré está a compor Les Loups. |
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