revoluciomnibus.com  James Anhanguera:Era Uma Vez A Revolução  V Era Uma Vez a VAGABUNDAGEM  ESTátuas

       Num passeio pomeridiano de domingo no quebra-mar da vila vejo-me a magicar à volta da figura de retórica da folia de Erasmo, em auto-elegia, e a imagem de Gilles e Anne empedrados ao luar em Les Visiteurs du Soir. Diz a Folia: ‘Tenho estátuas que bastem, tantas quantos os homens existentes, cada qual a carregar a minha expressão viva no semblante, embora na sua mente eu seja justamente o seu oposto.’ Pessoas ou estátuas animadas dá no mesmo, só se distinguem uma das outras por gestos mecânicos, automáticos, robotizados, irreflectidos - abstraídos. Pessoas como estátuas inconscientes do seu papel, seres inanimados, cada qual a sentir-se avis rara mas carneiro no rebanho. Atropelam-se aos magotes na Rua do Ouro nos dias de semana, vêm aos magotes atropelar-se no quebra-mar e na vila aos domingos, ou subjugar-se a engarrafamentos piores que os de dias de semana no passeio dos tristes de Lisboa a Sintra, via Cascais, ou vice-versa. Corpos frisados numa ilha de montagem em que se edita um filme sobre a ausência de singularidade em vida. Meses em contacto constante com a loucura, a reflectir no fundo sobre a minha loucura e as formas de viver no mundo prático e materialista com ela. A representar da forma mais absurda, que é como no fundo toda a gente faz. As limitações do meio, apesar da revolução ‘universalizante’ por que o país passou, ainda tão pequeno e provinciano. E as limitações dos meios, produtos de uma sociedade ainda muito resignada e fechada.

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