Ivan sai para votar. É funcionário público, não tem como escapar. De todo o modo só dois por cento dos cidadãos com direito a voto omitem-se nas primeiras eleições livres do país. Tudo a finalmente poder exercer o seu direito e a orgulhar-se disso.

- Claro que não vais votar em nenhum desses gajos, né?

- Claro que sim!

            - Em quem? Em que partido?

            - No partido que melhor representa a causa popular.

            - A causa quê? E que partido é esse?

- Não digo, porque o voto é secreto – justifica-se, já a bater a porta de casa.

No regresso:

- E aí, foi complicado ou quê?

- Fácil, fácil.

- E em quem votaste?

- Não digo, já disse, o voto é secreto – responde já meio a rir, a glosar um dos slogans de consciencialização da população.

            - Ora, Ivan, não me venhas com essa! E que problema isso teria?

- Ok, tá bom, já que insistes tanto vou revelar-te o meu voto.

            Acende a cónica, dá uma passa, trava o fumo, abre a boca num esgar e recomeça a falar e a exalar fumo:

            - Peguei no boletim e desenhei isto assim, ó - desenha um falo no ar -, bem grande e escrevi embaixo: É disto que vocês precisam! Rá, rá, rá!

Vigília política após o primeiro banho eleitoral televisivo. Incompreendido por crítica e público quando fez uma no mínimo bizarra montagem de Galileu Galilei com o antigo Grupo de Teatro Oficina, hoje Comunidade Oficina Samba, e escorraçado pelos da sua classe Zé Celso Martinez Correa decidiu ir a Moçambique registar o nascimento de uma outra nação. Filmou a chegada de Samora Machel a Lourenço Marques, recepcionado pelos Marimbeiros de Zavala, os melhores takes de O Parto, que está a ser exibido pela RTP no primeiro aniversário do 25. O filme passa e nós a passar roupa.