Noites depois, seguimos JCP, eu, Jimi e Diogo no Morris ainda a tinir de branco do mixing de jornalista e atleta a assistir à peça em que Ofélia reina como mãe castradora ao lado do titubeante marido e substituto do actor principal Mário Viegas, em estreia absoluta no teatro profissional, que leva porrada da mulher, como os filhos de ambos, os também estreantes Luís Lucas e Fernando Heitor, travestidos de piranhas. Tragicomédia em altíssimo estilo a montagem de Ó Papá, Pobre Papá, a Mamã Pendurou-te no Guarda Roupa e Eu Estou Tão Triste na Casa da Comédia.

Ceamos e seguimos no Mini branco pela Estrada da Luz já com ela e sem Jimi, que decidiu recolher, até a casa da para o grupo nova diva absoluta, que ora acaricia o pescoço do motorista, ora me beija, ao seu lado, após eu – por uma vez sem gravador a tiracolo – tirar da cartola um exemplar de Águaviva e ler o trecho em que Clarice faz uma explanação sobre um relacionamento que se encerra com um retumbante eu sou eu, você é você - é lindo, é vasto, vai durar, e outro em que especula sobre a possibilidade de haver elefantes no seu ‘banheiro’.

Ela está caidinha de todo por Diogo, que parece não estar a fim dessa ou tem iaúfa quiçá por já ter lido Le Grand Écart e não querer mergulhar nessa de bas-fond integral, a coisa toda a dar ares de Der Blaue Engel com verrina brechtiana. Um dos hits entre a malta no momento, de Maria Bethânia, fala na arte de se jogar no ar antes de mergulhar, vou no embalo e mergulho de vez nesse universo de braços abertos: teatro, cinema, redacções cinematográficas, se fosse um filme seria em preto e branco e poderia chamar-se

    NOUVIELLE VAGUE

Selado fica ali um caso sui generis, de Grand Écart e-fec-ti-va-men-te, entre uma mulher madura e um pós-adolescente ingénuo, de dentes muito alvos e belo, apesar da extrema magreza, pureza quase virginal, que é o que no fundo mais encanta a mulher, num momento angustiante de insegurança pelas limitações políticas e por tabela financeiras impostas à profissão, após a saída de um divórcio. Não mudo mas por lá me instalo mais a minha colecção de discos de Roberto Carlos, que levo uma vez para provar-lhe como o Rei, embora em certos aspectos inegavelmente piroso, tem lá os seus grandes achados, o amor sempre tardio porque assim é obrigatório com uma dama do teatro, que só chega a casa de madrugada, duas vezes por semana em que tenho de escrever e ler os noticiários a partir das sete da manhã a voz treme mais que o habitual, porque também ainda não me habituei à nova faina, após uma hora de sono, já com as pancadas do corte peças de carne no talho de baixo, banho quente e pequeno almoço só às dez e meia n’A Brasileira, a dar-me alento para aguentar até à uma, quando é hora do banho de imersão e cama, que nunca é cedo.