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Findo o ciclo da emigração para o Brasil e com a exploração colonial de África a meio gás a Europa para que no fundo o país do minifúndio agrário continua de costas acaba por ser também uma forma do pequeno país-jardim à beira-mar implantado manter os olhos em horizontes mais largos, quando para os muito analfabetos não há cá disso de a Terra ser redonda e o homem ter posto os pés na Lua. Mas do Brasil a África e à Austrália já são muitos os pontos de referência além das terras atrás dos montes, embora quase ninguém tenha ideia de como por lá se vive. O trágico imaginário contemporâneo português é feito da lembrança de quem ‘por lá anda’, a fazer o Brasil, África, a Europa ou na faina artesanal do mar territorial, da Mauritânia e da Terra Nova, de que os bacalhoeiros trazem um acepipe a mais a juntar-se ao fabuloso manancial de frutos do mar da culinária local, acrescido das gambas ao alhinho de Moçambique. Na questão da guerra não se toca, pelo que em termos genéricos ela se resume aos boletins de ocorrências do Ministério da Defesa e às quase sempre dramáticas imagens das mensagens de Natal transmitidas pela RTP, não só pelo nervosismo e tensão dos soldados mas pelo temor do que se pressente estar no mato atrás das clareiras. Os programas do Ministério da Defesa e do Ultramar são apresentados por um mulato de carapinha. Mostram desfechos de acções em que invariavelmente se vê cubatas de turras a arder. Mas o olhar para tais imagens não é totalmente ingénuo, depois de tantos relatos de chacinas no Vietname, e que se reflecte em pequenos grandes dramas de cada círculo familiar, onde quando não há um filho ou dois a combater em África ou de férias na afinal paradisíaca comissão de dois anos em Timor, há os recém-nascidos quiçá para ainda servir de bucha-de-canhão ou adolescentes a ‘dar o salto’ para alguma terra distante quando a incorporação se aproxima. Toca-me cá um fadinho... deixa-me cá chorar um pouco. Que espiga! A mitologia do fado, do mar de onde se parte e a que se chega, Barco Negro – entretanto também Gare de Santa Apolónia e de Austerlitz -, da saudade, que não é só nostalgia, nem to miss, nem régreter l’absence ou é tudo isso, como explica-me Octavio Paz. A emigração dos anos 60 abriu horizontes para o que estava atrás das costas do país, como uma outra assombração sem tamanho, além do mar, indumentária sempre de luto, ondas a carcomer dias e noites, o imaginário em lonjuras inimagináveis, inalcançáveis, inconcebíveis, lenços brancos, lágrimas, despedidas. É o que apanham as fotos das pessoas do país. Terra de brandos costumes mas sentimento trágico profundo, histórias trágico-marítimas agora também ferroviárias. Ainda é uma diversão ir ver os aviões a partir e pousar na aerogare da Portela de Sacavém, a um passo da cidade, mas não ver barcos a ancorar ou a partir do terraço do cais de Alcântara apinhado, como me ocorreu recentemente, num rio-mar de lenços brancos a esvoaçar sobre rostos banhados em lágrimas e gritos dilacerantes à partida dos paquetes para Bissau, Luanda, Lourenço Marques e Dili. Portugal produz três mini-Vietnames. Lá, 45 mil americanos mortos, 500 mil mutilados. Acolá, 8300 tugas mortos e 26 mil mutilados. Fora os que dão o pisga, a desmembrar muitas outras famílias. |
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